ANOMALIA FINANCEIRA
Humberto de Campos - Discurso de recepção na Academia Brasileira de Letras, 1920.
Certas vez, ia Emílio de Menezes em um bonde, quando se sentaram no banco imediato, em frente, duas senhoras de grandes banhas, que dificilmente puderam entrar no veículo. Com o peso das duas matronas, o banco, que era frágil, range, estala, geme, estranhando a carga. O poeta, que observa o caso, leva a mão à boca, no seu gesto característico, e põe-se a rir em silêncio, no seu riso sacudido e interior, E como se o companheiro o olhasse, explicou:
- Sim, senhor! É a primeira vez que vejo um banco quebrar por excesso de fundos!...
REVENDO UMA DIFICULDADE
J.M. de Macedo - "Ano Biográfico", vol. III, pág. 101.
Naturalista de grande nomeada, foi Alexandre Rodrigues Ferreira incumbido pelo governo português de estudar as riquezas do Brasil, principalmente as do vale amazônico. De volta a Belém do Pará, encontrou aí, desolado, o capitão Luiz Pereira da Cunha, intermediário dos produtos por ele mandados para o reino, o qual se queixava de não haver recebido do governo as importâncias que, ademais, constituíam o dote de sua filha.
- Se o seu desgosto é esse, meu amigo, estou pronto a fazê-lo desaparecer - declarou-lhe o sábio.
E num originalíssimo pedido de casamento:
- Eu caso com a sua filha, e prescindo do dote!
A LÓGICA DA NATUREZA
Moreira de Azevedo - "Mosaico Brasileiro", pág. 32.
Considerado cúmplice da Conjuração Mineira e atirado aos subterrâneos da ilha das Cobras, o poeta Alvarenga Peixoto sentiu, ao ouvir ler a sua sentença de morte, tamanho choque nervoso, que, em uma noite, os seus cabelos, de negros que eram, se tornaram totalmente brancos.
- Ah, senhor! Como envelhecestes da noite para o dia! - exclamou, ao vê-lo, pela manhã, o carcereiro.
O poeta sorriu:
- A Natureza é justa, amigo.
E com estoicismo:
- Eu devia morrer velho; mas, como os homens me condenaram ainda moço, apressou-se a morte em envelhecer-me...
A RESTAURAÇÃO DO HINO
Ernesto Sena - "Deodoro", pág. 157.
Com a queda do Império havia ficado abolido o Hino Nacional de Francisco Manuel, adotando-se outro, de Leopoldo Miguez. Toda a gente sentia, porém, saudades do velho símbolo musical, vigoroso como poucos.
A 15 de novembro de 1890, os representantes da imprensa resolveram pedir a Deodoro a reabilitação do antigo, refugado por imperial. Antes, porém, convencionaram com os mestres das bandas militares postadas dentro e nos jardins do palácio, então o Itamarati, para que, obtido o assentimento, tocassem, a um tempo, a soberba epopéia musical.
Obtido o consentimento do ditador, fez-se o gesto combinado. As bandas, a um tempo, atacaram as notas do nosso canto de guerra, sagrado nos campos de batalha. Foi um momento emocionante. Muita gente chorava. O próprio Deodoro tinha os olhos úmidos.
Lá fora, entretanto, na rua, o povo fugia, correndo em todas as direções, supondo que as forças armadas haviam, lá dentro, restaurado a monarquia!...
Fonte: Humberto de Campos. O Brasil Anedótico (1927).
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