Por Ricardo Alcântara (*)
É verdade. Enfrentar oposição qualificada colabora para o bom desempenho de qualquer governo. Quase tão importante é haver, além de oposição, massa crítica interna, gente com autonomia para submeter seu comando político ao incômodo de uma reflexão frequente sobre os próprios atos.
Em geral, governantes não apreciam a ideia. O cercadinho dos bajuladores costuma ser alimentado com melhor ração do que aquela servida a quem cultiva a crença arcaica da independência de espírito como atributo virtuoso. A crítica, quando subsiste, não escapa à suspeição de má vontade.
O poder é melindroso. Reizinhos, quando escutam, o fazem como ato de cortesia e esperam eterna gratidão pela atenção momentânea dedicada aos subalternos. Daí, o tempo se encarrega de ampliar os espaços por onde a mediocridade se esgueira e de cercar de providências a inteligência e seus riscos.
Nada trágico, caso seu excesso afetasse somente os governantes – eles passam, e passam ainda mais rápidos os que se julgam eternos. Mas não. O pior mal da cultura dos palácios não é o que ela causa aos transitórios governantes, mas o dano causado aos governados, pois estes permanecem.
Discute-se agora em Fortaleza, e muito frequentemente, sobre a necessidade de fortalecer a oposição política ao grupo familiar dos Ferreira Gomes, cuja sigla hospedeira atual é o PSB e a quem a cidade de Fortaleza acaba de conceder uma hegemonia política inédita nos últimos trinta anos.
Se, mais do que o exercer o poder de modo incontestável, pretendem eles legar uma obra pública que poucos reparos mereçam do futuro, deveriam cuidar em arejar seus corredores e abrir o piso lustrado de seus salões às solas empoeiradas dos que andam pelas ruas a ouvir seu povo.
Não é o que acontece, a julgar pela despudorada arbitrariedade dos encaminhamentos dados ao caso, por exemplo, de parente seu, maior de idade, que, envolvido em uma ocorrência policial, exibiu à sociedade, e não sem base, a inabalável confiança que deposita na impunidade de seus atos.
Não parece haver, nos quadros disponíveis da vassalagem, gente disposta a lembrá-los de que está no abuso de poder, mais do que nos erros eventuais de quem detém a responsabilidade de mando, o que faz dele algo menos digno aos olhos da plebe – silenciosa, mas não igualmente desatenta.
Às vezes, leio os antigos. Antes mesmo que Roma fosse às chamas, disse Lao-tsé que um governante deveria retardar ao máximo seu momento de apogeu. Para a defesa da paradoxal sentença, sustentava um argumento geométrico, desconcertante por sua simplicidade: depois do apogeu, só há decadência.
Que coisa feia, meu bixim...
Procura-se – vivo, de preferência, para que tenha a oportunidade de reparar seus erros – o “gênio” que criou o cartaz para a Copa do Mundo em Fortaleza, bem como o agente público que autorizou a divulgação do mesmo. Façam a coisa certa: comecem de novo. Admitir erros é gesto nobre.
(*) Jornalista e escritor. Publicado In: Pauta Livre.
Pauta Livre é cão sem dono. Se gostou, passe adiante.
Nenhum comentário:
Postar um comentário