Pouco importa se é ou não direito líquido de Cid Gomes contratar a estridente Ivete Sangalo para abrir as portas de um hospital anunciando que ali também “vai rolar a festa”, muito embora, lugar de sofrimento, tenha as vocações do silêncio.
Quando um governador recorre à sua reserva de prerrogativas legais para justificar decisões de razoabilidade nula, já entra no debate muito fragilizado. Tivesse ficado somente nisso, menos mal. Fez pior: deu mais um de seus chiliques.
Acumulando equívocos, ao desbocado “doa a quem doer” – de resto, uma expressão infeliz quando a polêmica tem como objeto um equipamento hospitalar – seguiu-se o destempero habitual contra um membro do Ministério Público.
Ao acusar o procurador-geral Gleydson Pinheiro de vedetismo – estaria “criando caso” porque “quer aparecer” – tornou mais fácil identificar o desvio de conduta na sua intolerância de agressor do que no zelo funcional do agredido.
Cid Gomes não percebe quão afetado transparece ser. Não se vê ele dedicado ao debate paciente, mas sempre incomodado quando decisão sua provoca leituras contrárias à sua vontade – o que é, de resto, a regra (exceção é a unanimidade).
Ao pragmatismo com que se organiza como condutor político não corresponde uma previsível maturidade psicológica. A expressão arrogante ora simula indiferença à crítica, ora se revela exasperada com o que lhe parece intolerável.
Qualquer observador mais experiente percebe que a rigidez defensiva com que insiste em se expressar com presumida superioridade moral e intelectual mal oculta a insegurança emocional em que se sustenta.
Pode-se julgá-lo relapso com a moralidade pública, quando permite que familiares de seus auxiliares sejam credores dos funcionários de seu governo. Pode-se, ainda, questionar algumas de suas decisões em um ou outro aspecto e isso tem sido feito.
Mas, operosa, sua gestão alcança índices de aprovação satisfatórios. Deveria ser motivo suficiente para serenar seus argumentos. Mas o que se vê? Uma antecipada inadmissibilidade de qualquer possibilidade de erro.
O narcisismo, patente no modo como se expressa, se move pela crença delirante de que estarão necessariamente movidos por má vontade todos que dele discordarem. É como se a sociedade devesse a ele o imenso favor de governá-la.
Irá mais longe, caso mais assessoria e menos bajulação aceite em seu entorno, contrariando assim a rótulo recorrente, e nem sempre preconceituoso, de ser ele, no fundo, um líder provinciano. Ninguém lhe dirá a verdade, se não quiser ouvi-la.
(*) Jornalista e escritor. Publicado In: Pauta Livre.
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