Por Ricardo
Alcântara (*)
Já vi governo mal assessorado embarcar em canoa furada de
pesquisa. O furo não estava nos índices, mas na leitura oferecida sobre eles –
generosa para o ego do governante e ainda mais conveniente para a estratégia da
deslealdade em curso.
Vamos por partes. Quando uma pesquisa oferece um índice
de aprovação de governo, isto não quer dizer que os cidadãos estejam,
necessariamente, de todo satisfeitos com ele. O dado, por si, não define um
estado qualitativo, de entusiasmo.
O que na maior parte o dado indica – o cruzamento com
outros é que determinará o percentual de aprovação efetiva – é que o cidadão
considera haver no governo, face às circunstâncias, operosidade no
enfrentamento dos problemas, o que é bom.
Explico melhor: índices genéricos de aprovação afirmam,
mais do que adesão de massa, um estado de boa compreensão sobre a relação
intencional: é o saldo entre esforço e dificuldade, propósito e circunstância,
que está sendo (bem) medido ali.
Assim, é compreensível que o governo Cid Gomes, tão
criticado por resultados pífios em Segurança, conte com aprovação – moderada ou
decidida – de metade dos cearenses: o resultado é uma ponderação entre
desempenho e circunstância.
O dado imediato mais revelador sobre a adesão ao governo
é o percentual que o define como “ótimo”: ali está o cidadão que pede a palavra
quando o governo é criticado nas rodas de bate-papo, que é onde a inclinação
potencial se multiplica.
No caso do Ceará, pesquisa recente (Ibope) revela, no
item, índice modesto para um governador que alega ter feito em sete anos o
dobro do que foi realizado em doze por quem ele considera(va) “o maior político
vivo do Ceará”. Conta esquisita.
Não supera a faixa de 5%, o percentual “ótimo” de
cearenses que reconhecem o “grande salto” que Cid Gomes imagina ter dado no
estado. Se for mesmo para comparar, o fato é: Tasso Jereissati fechou o sétimo
ano com o dobro mais dois.
Como não era homem de consensos, mas forte de
temperamento e excludente nos métodos, o ex-governador obtinha, por outro lado,
índice mais elevado de rejeição do que o indicado agora para um governo que não
tem o PT nos calcanhares.
Se o governador está tão convicto de que realiza
extraordinária obra, há muito a ser avaliado: em 26 anos (1987-2013), não
recordo pesquisa que tenha colocado uma gestão cearense em décimo lugar na
avaliação dos governadores brasileiros.
Os cinco mandatos do ciclo tucano – Tasso, Ciro, Tasso,
Tasso e Lúcio – nunca frequentaram a faixa intermediária da lista: estavam
sempre entre os cinco melhor avaliados. Mas talvez incomode ao governador
investigar as razões de tudo isso...
O que muito favorece a Cid Gomes na perspectiva de sua
sucessão é que, baseado numa margem ampla de aceitação (aprovação moderada), e
poderosos apoios eleitorais, seu candidato é potencialmente favorito em quadro
semelhante ao atual.
Digo em “quadro semelhante ao atual” porque 2014 é
movediço: a Copa do Mundo, já se viu, poderá acionar forças a princípio
antagônicas, de ufanismo e indignação, combinadas numa equação ainda não
formulada pela realidade. Até lá, veremos.
Como não se sabe ainda a direção e a força dos ventos
adiante, ninguém deveria se julgar de fato seguro sem bom calado e quilha
profunda. Quem prometeu o “grande salto” ficará satisfeito se der pelo menos um
passo adiante, fazendo o sucessor.
(*) Jornalista e
escritor. Publicado In: Pauta Livre.
Pauta Livre
é cão
sem dono. Se gostou, passe adiante.
Nenhum comentário:
Postar um comentário