Por
Prof. Felipe Aquino (*)
A
Igreja não tem dúvida em afirmar que a Ressurreição de Jesus foi um evento
histórico e transcendente. No §639 o Catecismo afirma: “O mistério da
Ressurreição de Cristo é um acontecimento real que teve manifestações historicamente
constatadas, como atesta o Novo Testamento. Já S. Paulo escrevia aos Coríntios
pelo ano de 56: “Eu vos transmiti… o que eu mesmo recebi: Cristo morreu por
nossos pecados, segundo as Escrituras. Foi sepultado, ressuscitado ao terceiro
dia, segundo as Escrituras. Apareceu a Cefas, e depois aos Doze” (1Cor 15,3-4).
O apóstolo fala aqui da viva tradição da Ressurreição, que ficou conhecendo
após sua conversão às portas de Damasco.
O
primeiro acontecimento da manhã do Domingo de Páscoa foi a descoberta do
sepulcro vazio (cf. Mc 16, 1-8). Ele foi a base de toda a ação e pregação dos
Apóstolos e foi muito bem registrada por eles. São João afirma: “O que vimos,
ouvimos e as nossas mãos apalparam isto atestamos” (1Jo1,1-2). Jesus
ressuscitado apareceu a Madalena (Jo 20, 19-23); aos discípulos de Emaús (Lc
24,13-25), aos Apóstolos no Cenáculo, com Tomé ausente (Jo 20,19-23); e depois,
com Tomé presente (Jo 20,24-29); no Lago de Genezaré (Jo 21,1-24); no Monte na
Galiléia (Mt 28,16-20); segundo S. Paulo “apareceu a mais de 500 pessoas” (1
Cor 15,6) e a Tiago (1 Cor 15,7).
S.
Paulo atesta que Ele “… ressuscitou ao terceiro dia, segundo as Escrituras, e
foi visto por Cefas, e depois pelos Onze; depois foi visto por mais de
quinhentos irmãos duma só vez, dos quais a maioria vive ainda hoje e alguns já
adormeceram; depois foi visto por Tiago e, em seguida, por todos os Apóstolos;
e, por último, depois de todos foi também visto por mim como por um aborto” (1
Cor 15, 3-8).
“Deus
ressuscitou esse Jesus, e disto nós todos somos testemunhas” (At 2, 32), disse
São Pedro no dia de Pentecostes. “Saiba com certeza toda a Casa de Israel: Deus
o constituiu Senhor (Kýrios) e Cristo, este Jesus a quem vós crucificastes” (At
2, 36). “Cristo morreu e reviveu para ser o Senhor dos mortos e dos vivos” (Rm
14, 9). No Apocalipse, João arremata: “Eu sou o Primeiro e o Último, o Vivente;
estive morto, mas eis que estou vivo pelos séculos, e tenho as chaves da Morte
e da região dos mortos” (Ap 1, 17s).
Toda a
pregação dos Discípulos estava centrada na Ressurreição de Jesus. Diante do
Sinédrio Pedro dá testemunho da Ressurreição de Jesus (At 4,8-12). Em At
5,30-32 repete. Na casa do centurião romano Cornélio (At 10,34-43), Pedro
faz uma síntese do plano de Deus, apresentando a morte e a ressurreição de
Jesus como ponto central. S. Paulo em Antioquia da Pisídia faz o mesmo (At
13,17-41).
A
presença de Jesus ressuscitado era a manifestação salvífica definitiva de Deus,
inaugurando uma nova era na História humana; era a força dos Apóstolos. Jesus
ressuscitado caminhou com eles ainda quarenta dias e criou a fé dos discípulos
e não estes que criaram a fé no Ressuscitado.
A
primeira experiência dos Apóstolos com Jesus ressuscitado, foi marcante e
inesquecível: “Jesus se apresentou no meio dos Apóstolos e disse: “A paz esteja
convosco!” Tomados de espanto e temor, imaginavam ver um espírito. Mas ele
disse: “Por que estais perturbados e por que surgem tais dúvidas em
vossos corações? Vede minhas mãos e meus pés: sou eu! “Apalpai-me e entendei
que um espírito não tem carne nem ossos, como estais vendo que eu tenho”.
Dizendo isto, mostrou-lhes as mãos e os pés. E, como, por causa da alegria, não
podiam acreditar ainda e permaneciam surpresos, disse-lhes: “Tendes o que
comer?” Apresentaram-lhe um pedaço de peixe assado. Tomou-o então e comeu-o
diante deles” (Lc 24, 34s).
Os
Apóstolos não acreditavam a principio na Ressurreição do Mestre. Amedrontados,
julgavam ver um fantasma, Jesus pede que o apalpem e verifiquem que tem carne e
ossos. Nada disto foi uma alucinação, nem miragem, nem delírio, nem mentira, e
nem fraude dos Apóstolos, pessoas muito realistas que duvidaram a principio da
Ressurreição do Mestre. A custo se convenceram. O próprio Cristo teve que falar
a Tomé: “Apalpai e vede: os fantasmas não têm carne e osso como me vedes
possuir” (Lc 24,39). Os discípulos de Emaús estavam decepcionados porque “nós
esperávamos que fosse Ele quem restaurasse Israel” (Lc 24, 21).
Estes
depoimentos “de primeira hora”, concebidos e transmitidos pelos discípulos
imediatos do Senhor, são argumentos suficientes para dissolver qualquer teoria
que quisesse negar a ressurreição corporal de Cristo, ou falar dela como
fraude. Esta fé não surgiu “mais tarde”, como querem alguns, na história das
primeiras comunidades cristãs, mas é o resultado da missão de Cristo
acompanhada dia a dia pelos Apóstolos.
Com
os Apóstolos aconteceu o processo exatamente inverso do que se dá com os
visionários. Estes, no começo, ficam muito convencidos e são entusiastas, e pouco
a pouco começam a duvidar da visão. Já com os discípulos de Jesus, ao
contrário, no princípio duvidam. Não creem em seguida na Ressurreição. Tomé
duvida de tudo e de todos e quer tocar o corpo de Cristo ressuscitado. Assim
eram aqueles homens: simples, concretos, realistas. A maioria era pescador, não
eram nem visionários nem místicos. Um grupo de pessoas abatidas, aterrorizadas
após a morte de Jesus. Nunca chegariam por eles mesmos a um auto-convencimento
da Ressurreição de Jesus. Na verdade, renderam-se a uma experiência concreta e
inequívoca.
Impressiona
também o fato de que os Evangelhos narram que as primeiras pessoas que viram
Cristo ressuscitado são as mulheres que correram ao sepulcro. Isto é uma mostra
clara da historicidade da Ressurreição de Jesus; pois as mulheres, na sociedade
judaica da época, eram consideradas testemunhas sem credibilidade já que não
podiam apresentar-se ante um tribunal. Ora, se os Apóstolos, como afirmam
alguns, queriam inventar uma nova religião, por que, então, teriam escolhido
testemunhas tão pouco confiáveis pelos judeus? Se os evangelistas estivessem
preocupados em “provar” ao mundo a Ressurreição de Jesus, jamais teriam
colocado mulheres como testemunhas.
Os
chefes dos judeus tomaram consciência do significado da Ressurreição de Jesus,
e, por isso, resolveram apaga-la: “Deram aos soldados uma vultosa quantia
de dinheiro, recomendando: “Dizei que os seus discípulos vieram de noite,
enquanto dormíeis, e roubaram o cadáver de Jesus. Se isto chegar aos ouvidos do
Governador, nós o convenceremos, e vos deixaremos sem complicação”. Eles
tomaram o dinheiro e agiram de acordo com as instruções recebidas. E
espalhou-se esta história entre os judeus até o dia de hoje” (Mt 28, 12-15). A
ressurreição corporal de Jesus era professada tranquilamente pela Igreja
nascente, sem que os judeus ou outros adversários a pudessem apontar como
fraude ou alucinação.
Os
Apóstolos só podiam acreditar na Ressurreição de Jesus pela evidência dos
fatos, pois não estavam predispostos a admiti-la; ao contrário, haviam perdido
todo ânimo quando viram o Mestre preso e condenado; também para eles a
ressurreição foi uma surpresa.
Eles
não tinham disposições psicológicas para “inventar” a notícia da ressurreição
de Jesus ou para forjar tal evento. Eles ainda estavam impregnados das
concepções de um messianismo nacionalista e político, e caíram quando viram o
Mestre preso e aparentemente fracassado; fugiram para não ser presos eles
mesmos (Cf. Mt 26, 31s); Pedro renegou o Senhor (cf. Mt 26, 33-35). O conceito
de um Deus morto e ressuscitado na carne humana era totalmente alheio à
mentalidade dos judeus.
E a
pregação dos Apóstolos era severamente controlada pelos judeus, de tal modo que
qualquer mentira deles seria imediatamente denunciada pelos membros do Sinédrio
(tribunal dos judeus). Se a ressurreição de Jesus, pregada pelos
Apóstolos não fosse real, se fosse fraude, os judeus a teriam desmentido, mas
eles nunca puderam fazer isto.
Jesus
morreu de verdade, inclusive com o lado perfurado pela lança do soldado. É
ridícula a teoria de que Jesus estivesse apenas adormecido na Cruz.
Os
vinte longos séculos do Cristianismo, repletos de êxito e de glória, foram
baseados na verdade da Ressurreição de Jesus. Afirmar que o Cristianismo nasceu
e cresceu em cima de uma mentira e fraude seria supor um milagre ainda maior do
que a própria Ressurreição do Senhor.
Será
que em nome de uma fantasia, de um mito, de uma miragem, milhares de fiéis
enfrentariam a morte diante da perseguição romana? É claro que não. Será que em
nome de um mito, multidões iriam para o deserto para viver uma vida de
penitência e oração? Será que em nome de um mito, durante já dois mil anos,
multidões de homens e mulheres abdicaram de construir família para servir ao
Senhor ressuscitado? Será que uma alucinação poderia transformar o mundo? Será
que uma fantasia poderia fazer esta Igreja sobreviver por 2000 anos, vencendo
todas as perseguições (Império Romano, heresias, nazismo, comunismo,
racionalismo, positivismo, iluminismo, ateísmo, etc.)? Será que uma alucinação
poderia ser a base da religião que hoje tem mais adeptos no mundo (2 bilhões de
cristãos)? Será que uma alucinação poderia ter salvado e construído a
civilização ocidental depois da queda de Roma? Isto mostra que o testemunho
dos Apóstolos sobre a Ressurreição de Jesus era convincente e arrastava, como
hoje.
Na
verdade, a grandeza do Cristianismo requer uma base mais sólida do que a fraude
ou a debilidade mental. É muito mais lógico crer na Ressurreição de Jesus do que
explicar a potência do Cristianismo por uma fantasia de gente desonesta ou
alucinada. Como pode uma fantasia atravessar dois mil anos de história, com 266
Papas, 21 Concílios Ecumênicos, e hoje com cerca de 4 mil bispos e 416 mil
sacerdotes? E não se trata de gente ignorante ou alienada; muito ao contrário,
são universitários, mestres, doutores.
(*) O Prof. Felipe Aquino é doutor em Engenharia
Mecânica pela UNESP e mestre na mesma área pela UNIFEI. Foi diretor geral da
FAENQUIL (atual EEL-USP) durante 20 anos e atualmente é Professor de História
da Igreja do “Instituto de Teologia Bento XVI” da Diocese de Lorena e da Canção
Nova. Cavaleiro da Ordem de São Gregório Magno, título concedido pelo Papa
Bento XVI, em 6/02/2012. Foi casado durante 40 anos e é pai de cinco filhos. Na
TV Canção Nova, apresenta o programa “Escola da Fé” e “Pergunte e
Responderemos”, na Rádio apresenta o programa “No Coração da Igreja”. Nos
finais de semana prega encontros de aprofundamento em todo o Brasil e no
exterior. Escreveu 73 livros de formação católica pelas editoras Cléofas,
Loyola e Canção Nova.