Nossa república se inunda de contradições: os
militantes de antes se renderam ao mandar fazer silêncio. Dão banquetes e
patrocinam ditaduras que repetem, em igual ou pior feito, tudo o que lutaram
contra. À imprensa, restam agora as tentativas de minar o bom exercício e a
fala livre. Os ditadores das redondezas não escondem a simpatia por nosso solo,
enquanto nosso prestígio internacional é comparado ao vexaminoso papel no
superestimado futebol.
O Tribunal Regional Eleitoral não foge à regra da
Presidência e seu partido: baixou liminar que coíbe a livre expressão de
médicos brasileiros contra os disparates públicos, sob forma de camisetas ou
adesivos. Não há campanha a favor de qualquer que seja o candidato: há uma
forma autêntica de se expressar o descontentamento não propriamente pelo que
houve contra a categoria, mas sim pelo desserviço à saúde pública brasileira.
Menos da metade das UPAs prometidas foram
construídas, as unidades básicas continuam sucateadas sem medicamentos
elementares, os hospitais filantrópicos que respondem por boa parte do
atendimento gratuito fecham suas portas por uma tabela defasada há mais de 10
anos. Ficaram ociosos quase R$ 20 bilhões ao SUS no último ano. Os hospitais
superlotados patrocinam mortes gratuitas e, principalmente, a vinda de médicos
de baixa qualificação ludibria a população de que tudo anda bem. De nada
adianta haver o médico, seja ele nato ou importado, se o sistema não funciona.
No entanto, nessa república que flerta com ditaduras e a cada dia se assume
mais como tal, denunciar não surte efeito: blindam-se, fecham os olhos, tapam
os ouvidos...
Se não me permitem mais expressar meu
descontentamento com a saúde com roupas ou adesivos, não há problema. Não
toleram que alertemos a população contra a ingerência que instalam e que querem
perpetuar, mas toleram a campanha a favor feita por quase 13 mil funcionários
da ditadura cubana que têm em seus carimbos o principal mote da campanha
presidencial: “Programa Mais Médicos para o Brasil”. Há, pois, quase 13 mil
cabos eleitorais a trabalho daqueles que não aceitam campanha contra.
No entanto, ainda me restam olhos, ouvidos e mãos
para sentir a realidade de quem depende dos serviços gratuitos de saúde. Sou eu
quem está na linha de frente, essa que mais parece fronte de uma batalha
sangrenta, cuja militância veda seus próprios ouvidos, lacra seus olhos. Não
querem ver, não querem ouvir... Mas se esquecem de que me resta a boca. E essa
eles não vão conseguir calar.
Médico residente de
Neurologia – Hospital Geral de FortalezaFonte: Publicado In: O Povo, Opinião, de 30/7/2014.
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