O déficit divulgado ontem foi o pior para o mês da
série histórica. Quantas vezes você leu esta frase nas páginas de economia este
ano? Não pare de ler, não é notícia velha. É um novo vermelho nas contas
públicas de novembro, de R$ 6,7 bilhões. No ano, o déficit primário é de R$
18,3 bilhões. Para fechar na nova meta de R$ 10 bilhões de superávit, será
preciso um dezembro com azul de R$ 28 bilhões.
É dura a herança que Dilma receberá de Dilma. A
presidente terá que começar o segundo mandato herdando vermelhos velhos na
balança comercial, no déficit público, no resultado da conta-corrente, no setor
elétrico, na dívida pública. E tem a meta de chegar a um resultado positivo, em
2015, de no mínimo R$ 66 bilhões, segundo contou Joaquim Levy.
Na minha terra, em Minas, há duas cidades próximas.
Uma chamada Vermelho Velho, e a outra, Vermelho Novo. Assim estará o governo a
partir de quinta-feira, tentando separar o déficit antigo do que vier a ser
responsabilidade da nova administração.
A arrecadação até subiu no ano, em 3,9%, mas as
despesas cresceram num ritmo mais veloz: 12,7%. E isso não é tudo. A nova
equipe que assumirá está vasculhando as contas atrás de déficits ocultos. Na
área de energia, há uma lista infindável de contas dependuradas no Tesouro,
além daquelas que já se sabe que foram cobertas com empréstimos bancários que
serão pagos através de aumentos da conta de luz.
O problema é que, quanto maior for a herança deixada
por Dilma para o novo governo Dilma, mais difícil será o ajuste. Nesta reta
final, com os ministros ainda não empossados olhando as contas por dentro, está
ficando claro que o rombo é de fato tão grande quanto diziam os mais
pessimistas.
Um dos truques que ajudaram a recobrir de azul as
velhas contas vermelhas foi o de antecipar dividendos de estatais. Não poderá
mais ser feito. Não apenas porque a nova equipe já abjurou a velha prática,
como será impossível mesmo. A Petrobras não terá condições de pagar agora os R$
2 bilhões previstos por ter recebido mais quatro campos de pré-sal na Bacia de
Campos. A Eletrobrás não poderá pagar dividendos, simplesmente por não ter
lucro. Ela está com dificuldades para pagar o que deve à Petrobras. Sobram os
bancos públicos, mas o BNDES precisa manter seus recursos porque acaba de
receber um novo cheque do Tesouro e o aviso prévio de que não haverá outros.
Em entrevista da qual participei com a então
candidata Dilma, em 2010, perguntei se não havia risco de aumentar o déficit
público e a dívida bruta caso ela ganhasse. Lembrei que ela, anos antes, na
chefia da Casa Civil, havia chamado de rudimentar a proposta do ex-ministro Antonio
Palocci de buscar o déficit nominal zero. Dilma respondeu a pergunta, que lhe
fiz em entrevista na CBN, dizendo que eu estava errada “no número e no
conceito”. Ao fim do seu primeiro mandato o que se constata, infelizmente, é
que o erro não era meu. O déficit público nominal está fechando o ano em 5,6%
do PIB e a dívida pública bruta está em 63% do PIB. Quando ela assumiu, estava
em 54%.
O trabalho de arrumar as contas não será fácil. O
governo persistiu demais no erro de achar que poderia enganar os números com
artimanhas fiscais e aumentar os gastos. Os dois ministros terão muito o que
fazer para tentar virar esse jogo. A aposta que fazem é que o gesto de mudar de
rumo já seja o primeiro passo para a reconquista da credibilidade da política
econômica.
(*) Jornalista e articulista de O
Globo.
Fonte: O Globo, 30/12/2014. Postado em
diversos blogs.
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