O problema
mais objetivo de um esquema de poder sustentado em um concerto político
justificado apenas pelas vantagens da corrupção é este: uma vez aceita a
ilicitude como base de sua permanência, o poder, que se nutre de sua capacidade
de regular continuamente os limites de sua potência em cada circunstância, já
não pode estabelecer limites a nenhum outro agente do processo de decisão
pública.
A certa altura, já não dá mais para
dizer: ‘aqui sim’, ‘isso não’. Fica, de fato, refém aquele que, obrigado a
zelar pela norma, aceitou rompê-la. Resta somente o direito de ficar calado ao
poder que já não pode nada porque, para que muito pudesse, pagou com a moeda
podre da corrupção, julgando comprar potência quando, na verdade, pagava por
sua própria servidão. Eis aí o Lulismo em um breve 3x4.
A Petrobras é
só a fratura exposta de um corpo em coma. No último trimestre, o faturamento
caiu 38% em relação ao período anterior. Em três dias, o valor de suas ações
caiu 20%. Apresentou um balanço tenebroso e já anuncia cortes na produção.
Contudo, continua (assim quer a presidente) sob a direção de quem já não recebe
retorno de suas ligações de mais ninguém. Enfim, zumbis gerindo escombros.
Dilma não demite
a ‘melhor amiga’ Graça Foster porque traria o líquido viscoso do escândalo para
a rampa de seu palácio. O que falta para incriminar a presidente? Uma prova.
Nada que um calhamaço de indícios não possa substituir, se a medicação amarga
do ajuste fiscal tardio provocar na sociedade as náuseas que os apertos de
cinto costumam causar. No Alvorada, foram-se as boas noites de sono.
O anúncio de
cancelamento da instalação de uma refinaria, solenemente prometida nos
palanques eleitorais para um estado que deu à presidente 80% de votos, é apenas
mais um ato vil neste circo de horrores. É a segunda notícia que a presidente
dá ao Ceará. A primeira foi a nomeação do ex-governador Cid Gomes para a pasta
da Educação, de onde ainda não pronunciou uma única palavra sobre o assunto.
De onde se
conclui: o estado vai mal, mas seus caciques passam bem, obrigado. O prefeito
de Sobral, Clodoveu Arruda, sugeriu, durante reunião recente de prefeitos, a
assinatura de uma ‘moção de protesto’ contra o cancelamento da refinaria. Há
certo tipo de protesto, como o sugerido pelo alcaide, que, de tão ornamentais,
mais reforçam do que enfraquecem as decisões que simulam a pretensão de anular.
É grande, o
aperreio dos petistas cearenses: sua presidente nos prometeu a refinaria e
nosso povo garantiu sua reeleição. Como irão agora justificar a vassalagem que
com toda certeza continuarão prestando a Brasília? Cancelada a refinaria, vai
começar o jogo do faz de conta. Seremos, uma vez mais, ludibriados: agora, com
os artifícios cênicos de uma indignação tão genuína quanto uma nota de dois
reais.
Aprendamos,
pois: não apenas somos pobres, como seremos tratados como tal enquanto
permitirmos que, por nossa pobreza, sejamos reféns das gorjetas
assistencialistas de governos que atendem ao comando dos agentes econômicos
mais poderosos. Se assim for, assim será: o estado estará mal, mas seus
caciques estarão bem, obrigado.
(*) Jornalista e escritor. Publicado In:
Pauta Livre.
Pauta Livre
é cão
sem dono. Se gostou, passe adiante.
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