quarta-feira, 1 de julho de 2015

NA PAIXÃO DA GUERRA, UM HERÓI DE CARÁTER


Franz Stigler e Charlie Brown
Por Elio Gaspari (*)
Ao final de um mês de paixões, tristezas, alegrias e cavalheirismo, aqui vai uma história na qual estes ingredientes se misturaram no pior dos cenários, o da guerra.
Em março de 1946, um ano depois da derrota da Alemanha, Franz Stigler estava em busca de trabalho quando foi reconhecido pela boa qualidade de suas botas. Eram as dos pilotos da Luftwaffe, aqueles que, segundo a propaganda do governo, salvariam a Alemanha da derrota.
Dos 28 mil pilotos do Reich, haviam sobrado só 1.200, mas ele foi reconhecido e insultado pelos compatriotas. Este pedaço da vida mostrou-lhe que as botas da glória haviam se transformado em marca de opróbrio. Franz não era um homem qualquer, mas, em 1946, ninguém haveria de se lembrar dele.
Salvo Charlie Brown. Três anos antes, Franz pilotava um caça Bf-109, protegendo o Norte da Alemanha, quando alcançou um B-17 de uma esquadrilha que bombardeara a região de Bremen. O avião americano estava em pandarecos. Ele podia ver tripulantes feridos e rombos na fuselagem. Tirou o dedo do gatilho e emparelhou seu caça com o bombardeiro.
Aquele avião não podia estar voando. Charlie Brown, o piloto do B-17, esperava apenas pelos últimos tiros. Viu o piloto alemão movendo a cabeça num incompreensível sinal afirmativo e achou que estivesse sonhando. Franz escoltou o B-17 durante dez minutos. Quando ele se aproximou da costa da Inglaterra, balançou as asas e voltou para a base alemã: “Não se atira em paraquedista. O avião estava fora de combate. Eu não carregaria isso na consciência”.
Charlie contou aos seus superiores o que lhe acontecera, mas mandaram-no ficar calado, pois propagaria um episódio capaz de comover os colegas com a ideia de que havia alemães civilizados.
Franz sobreviveu à guerra, mudou-se para o Canadá e só contou sua história em 1985. Não sabia o que acontecera ao B-17. De 12 mil bombardeiros, cinco mil haviam sido destruídos em combate. Na outra ponta, Charlie Brown, que vivia na Flórida, sonhava encontrar aquele alemão.
Escreveu uma carta para uma revista, descrevendo o estado de seu avião, com o cuidado de omitir um importante detalhe. Em 1990, os dois se encontraram. Franz tinha 75 anos e Charlie, 68. O alemão lembrou-lhe que o B-47 estava com o estabilizador destruído. Era o detalhe omitido.
Pouco depois, todos os sobreviventes do B-17 se reuniram, levando suas famílias. Eram 25 homens e crianças que deviam a vida a um homem que não apertou o gatilho.
Franz morreu em março de 2008. Charlie, em novembro.
 Serviço: Essa história está contada no livro “A Higher call”, de Adam Makos. Custa US$ 9,99, na rede, e vai virar filme.
(*)  Elio Gaspari é jornalista de O Globo.
Fonte: O Povo, 13/07/2014. DOM. p.27.

2 comentários:

  1. Belissima historia, professor.
    Atualmente estou lendo um livro muito bom sobre a 2a grande guerra: Inferno (O mundo em guerra 1939-1945) de Max Hastings.
    Vemos no livro, atraves de cartas dos combatentes, que atos como esse realmente aconteceram.

    Att
    Carlos Marcio

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  2. Belíssima história, professor.
    Estou lendo um livro chamado: Inferno (o mundo em guerra 1939 - 1945) de Max Hastings.
    Vemos no livro, atraves de cartas dos combatentes, que atos como esse realmente aconteceram.

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