Quem carrega nos
ombros o peso dos setenta ou oitenta, certamente se lembra com saudade das
festas juninas dos tempos de criança. Sobretudo os nascidos e criados no
Interior, e estes são muitos, pois nossas raízes são sertanejas. De origem remota,
as festas juninas eram acontecimento importante no calendário social e
religioso de cidades e vilas, e para elas as pessoas se preparavam com zelo e
cuidado. Em tempos mais distantes, chamavam-se festas Joaninas, focando o santo
homenageado. Em tempos mais recentes, dois santos menos cotados, Antônio e
Pedro, por terem na liturgia católica seus dias em junho, se somaram aos
festejos. Menos cotados – diga-se – em matéria de homenagens que tais, mas
respeitadíssimos em outras áreas. São Pedro já naquele tempo portava as chaves
do céu e comandava as torneiras dos bons invernos. Santo Antônio já era
alcoviteiro, arranjava casamentos e enchia de esperança as caritós. No entanto,
pálidas eram as homenagens que recebiam, a não ser nos lugares onde eram
padroeiros.
O ponto alto dos
festejos eram as fogueiras e delas se tiravam sinais. São Pedro, por exemplo,
costumava responder as consultas sobre o inverno vindouro. Uma garrafa cheia
d’água, enterrada sob a fogueira, indicava bom inverno se o nível d’água no dia
seguinte estivesse alto, ou mau inverno se estivesse baixo. Garrafa quase vazia
era sinal de seca braba. Verdade que ninguém punha em dúvida.
Mas, festa de
arrojo mesmo era a de São João. Fogueiras ingentes de madeira boa – sabiá, pau
branco, aroeira, anjico e outras – crepitavam majestosas para todo lado,
elevando suas chamas e fagulhas a metros de altura, tangendo para longe a
escuridão da noite, e animando os terreiros iluminados. Outras, pequenas de
propósito, permitiam a brincadeira do pular fogueira, das danças de roda, dos
compromissos de madrinha e afilhado, compromisso sério, diga-se de passagem,
implicando até na obrigação de tomar a bênção. Madrinha de fogueira era
respeitada.
Fartura, muita
fartura de alegria e comida, era o que se via: dança de quadrilha, milho verde
assado e cozido, pamonha, canjica, manjares deliciosos preparados com os frutos
da terra abundantes em fins d’águas.
A tradição
sobrevive graças ao esforço de abnegados, que tentam preservar a cultura do
País, mas pouco têm a ver os eventos “pasteurizados” de hoje com a doçura e a
espontaneidade das festas daquele tempo. Não é crítica, é constatação, até
porque os tempos são outros e seria descabido querer reproduzir um passado que
não volta mais. Onde encontrar lenha para as fogueiras, terreiros para
iluminar, ingenuidade como a daquele povo inculto para ouvir histórias de alma
e lobisomem nas rodas de calçadas, comendo pamonha e milho verde assado?
Nosso aplauso aos
que, de uma forma ou de outra, tentam manter viva a tradição, mesmo
incrementados os festejos com casamentos de matutos e outras brincadeiras que
naquele tempo não existiam. Até porque todos eram matutos. Importante é o
esforço de mostrar as coisas boas do passado, e que nossos maiores eram quiçá
mais felizes em sua simplicidade que nós, amantes da modernice, cercados de
comodidades que mais nos escravizam que confortam.
(*) Engenheiro civil e militar, e membro do
Instituto do Ceará.
Fonte: Publicado In: O
Povo. Fortaleza, 17/06/2015. Opinião. p.8.
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