João Brainer Clares
de Andrade (*)
O Ministério da
Saúde vale-se da máxima de que o país não tem médicos. Desconsiderando a díspar
distribuição desses profissionais, naturalmente atraídos por respeito, formação
e boas condições de trabalho, o Ministério insiste em contas que não traduzem a
realidade. Não colocam na conta que mais médicos pedem mais exames, prescrevem
mais medicamentos, demandam mais pareceres de especialistas. O grande ponto já
foi citado por Adib Jatene, afirmando que o Brasil precisa de médicos, de bons
médicos. A formação adequada consegue resolver boa parte das demandas ainda na
atenção básica e contingencia a solicitação de exames fúteis. O bom médico, quando
não resolve ir para atenção básica, iniciando especialização, também faz
diferença ao paciente: dentro da sua especialidade resolve melhor a demanda,
também contingenciando exames e internamentos.
Formar médicos para
o governo virou conta matemática. O Brasil já é o segundo do mundo em escolas
médicas; ganhamos com folga dos EUA. A conta engrossa os bolsos da iniciativa
privada: quase 70% das escolas médicas brasileiras são privadas, cobrando
mensalidades que ultrapassam os R$ 4 mil. No Ceará, foram cinco novas cidades
anunciadas como aptas à instalação de cursos. Grande erro, seja pelas contas,
falta de responsabilidade ou de mínimo conhecimento de como formar bom médico.
Não há duas medicinas; não há a medicina só para atenção básica ou só para os grandes
centros. Formar bons médicos exige professores bem titulados, pesquisa,
extensão e centros de excelência de atendimento. Tais exigências não impedem o
exercício na atenção básica; pelo contrário, quanto mais recursos, melhor
formado.
Nas contas do
Ministério não entraram a falta de professores mestres ou doutores, de
laboratórios, de unidades modelo que ensinem o que deve ser feito de correto, e
não o jeito brasileiro que faz de conta que presta bom atendimento. Faltam
programas de residência e hospitais nas novas cidades cearenses credenciadas a
receber cursos privados de medicina. A exigência do governo parece ter ficado
restrita ao apadrinhamento político, como se curso de medicina sem condições
mínimas representasse benefício à população. E talvez falte ainda até quem
esteja disposto a arcar com mensalidades além da casa dos R$ 4 mil. As contas
se distorcem, a expansão das universidades públicas emperra no corte faraônico
de recursos, perde-se a responsabilidade de formar bons médicos. Por fim, parece
que só valem dois números: o de médicos e o de votos.
(*) Médico residente de Neurologia – Hospital Geral de Fortaleza.
Fonte: Publicado In: O Povo, Opinião, de 9/4/2015. p.7.
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