Por
João Soares Neto (*)
A morte, independente da crença, do agnosticismo ou do ateísmo das
pessoas é ainda, para não fugir ao lugar comum, mistério. Pensadores, não os
mais recentes, debruçaram-se sobre o fim da vida. Cito dois para mostrar o
impacto quando alguém está próximo do fim ou quando se disserta sobre a morte.
Sêneca, sempre citado, foi coevo de Cristo. Ele, em “Cartas a
Lucílio”, afirma: “Nisto erramos: em ver a morte à nossa frente, como um
acontecimento futuro, enquanto parte dela já ficou para trás. Cada hora do
nosso passado pertence à morte”.
Em contraponto, o escritor francês L-F. Céline, morto em 1961,
destoa: “A maior parte das pessoas morre apenas no último momento”. Mas faz
ressalvas, logo em seguida: “Outras começam a morrer e a se ocupar da morte
vinte anos antes, e às vezes até mais. São os infelizes da terra”.
Recentemente, no curto espaço de uma semana, perdemos duas pessoas
que viveram até o último momento. Yolanda Vidal Queiroz e Francisco Ivens Sá
Dias Branco foram combatentes ao longo de suas vidas.
D. Yolanda, em 1982, perdeu o marido, o empresário Edson Queiroz,
de forma abrupta. Abatida, mas não desistente, apegou-se à fé que possuía e, em
pouco tempo, com a parceria da família e o seu primogênito Airton José Vidal
Queiroz, a lhe dar força e o ombro, tomou jeito e gosto para a sua nova, longa,
árdua e vitoriosa caminhada.
D. Yolanda comandava o Grupo Edson Queiroz-GEQ que tem como joia da
coroa a Universidade de Fortaleza. Afora a Unifor, a partir do escritório do
seu pranteado marido, transformado em relicário, D. Yolanda dirigia um complexo
empresarial que se dá ao luxo de ser fechado. Sem espaço para IPO ou abertura
de capital. Ela sabia o que acontecia, em âmbito nacional, nas suas áreas
tentaculares de comunicação, distribuição de gás, fábrica de eletrodomésticos e
forte presença agropecuária.
O GEQ representa hoje a doçura e a tenacidade de D. Yolanda aliada
à meticulosa alma profissional e sensibilidade do filho Airton compor o mundo
pelas versões multiformes do paisagismo e da arte espraiada na Unifor. A par
disso, emergem a energia e as possibilidades da terceira gestão.
Na missa de 7º. Dia de D.
Yolanda, a neta Joana falou: “Minha avó sempre foi o centro de nossa família e
ainda vamos ter que aprender a viver sem sua referência fisicamente conosco”.
Ivens, desde cedo, foi companheiro de seu pai, o panificador
português Manuel Dias Branco, vitorioso no interior do Ceará e de lá para
Fortaleza. Já industrial de sucesso,
Manuel, com saudade da terra mãe, transfere ao jovem Ivens, em 1953, o comando
de uma emergente indústria.
A partir daí, a desenvoltura foi a práxis da M. Dias Branco e da
Idibra que, ano após ano, cresciam e mereciam o reconhecimento da sociedade do
Ceará e do Brasil. A citação de Ivens entre os bilionários brasileiros na lista
anual da revista “Forbes” não é uma contraprestação de favor, mas
reconhecimento que se consolidara em pouco mais de 60 anos de sua gestão,
sempre espartana.
Para os que não sabem, Ivens era viajor e leitor qualificado,
curioso, com olhar de “insider” empresarial ao identificar, implantar e equilibrar
em sua balança empresarial atividades distintas, como empreendimentos
imobiliários, fábrica de cimento e moinho de trigo, ao seu “core business” de
líder nacional na área de massas e biscoitos.
Sempre ligado à família, já na terceira geração, lutou como fazem
os fortes surpreendidos por doenças graves. A discrição, o arrojo e a
organização eram as suas características basilares, aliadas ao bem fazer aos
seus colaboradores acometidos por males do bolso, do corpo ou da alma. Suas
empresas, consolidadas, continuam fortes e antenadas sob o olhar capaz do
predefinido sucessor, Ivens Jr., coadjuvado pela família.
Ambos, Yolanda e Ivens, profissionalizaram as diversas empresas que
compõem os seus distintos grupos. Tiveram o discernimento de, no tempo devido,
auscultar familiares, diretores e consultores externos para dar formatação
e continuidade aos complexos meandros de
suas organizações que compõem a dura
vida empresarial brasileira. Filhos e netos cresceram vendo exemplos, a forma
mais próxima da verdade de educar e de dar sentido ao que se faz por destino,
amor e coragem.
Às famílias Queiroz e Dias Branco, o meu pesar.
(*) João Soares Neto é
escritor e membro da Academia Cearense de Letras.
Fonte: Publicado no jornal O Estado-CE, em 1º/07/2016.
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