sexta-feira, 23 de setembro de 2016

NEM TUDO O QUE RELUZ É OURO


Pedro Henrique Saraiva Leão (*)

As populares hemorroidas afligem mais de 50% dos cinquentões. Não cabe maçar o leitor de jornal com sisudos e elaborados raciocínios científicos. No desenvolvimento dessas varizes, muito conta a constipação intestinal (prisão de ventre), e na gênese dos seus sinais sobressai a dieta como fator primordial. O retardo no trânsito intestinal determina constipação, com maior esforço às dejeções, e seu consequente crescimento, mais sintomas (sangramento e prolapso) de varizes retais antes silenciosas.

Tem-se hoje cientificamente comprovada a eficácia das fibras na prevenção não somente das varizes hemorroidárias, mas também da apendicite aguda, dos divertículos do grosso intestino, e das doenças coronarianas! As hemorroidas costumam acometer mais as mulheres (52%) do que os homens, como também ratificamos em 327 pacientes por nós operados na Faculdade de Medicina da UFC entre 1969 e 1971.

A rigor, as mulheres são mais constipadas, talvez até por fatores glandulares, e os homens não engravidam (até hoje, pelo menos!). Embora assaz comuns, as hemorroidas – como doença –poucas vezes estiveram “na moda”; raramente dão ibope. Entre seus portadores abundam os que se referem sem pejo – às vezes mesmo com júbilo – ao seu calista, ao seu psiquiatra, seu dentista, otorrino ou ao seu cardiologista; poucos, porém, mencionam abertamente seu proctologista, e geralmente, quando dele sentem o bisturi, lá dizem, com eufemismo, terem sido operados das “amídalas”!

A operação não é o único tratamento destas varizes, as quais – dependendo de seu estádio, ou grau – podem ser cuidadas por meio da eventual correção dos hábitos higieno-dietéticos, ou de injeções esclerosantes (1869), ligaduras elásticas (1963), crioterapia (congelamento) (1969), coagulação infravermelha (1977), cauterização pelos raios “laser” (1981), ou com o método mais recente, a desarterialização guiada por doppler.

O tratamento cirúrgico (hemorroidectomia), racionalizado e mundialmente adotado desde 1934 fica reservado para os casos mais acentuados, às hemorroidas antigas, dita do IV grau, complicadas com prolapsos, àquelas, enfim, que chamamos hemorroidas “de estimação”! Assim, acreditamos que a operação não está indicada em mais de 35% dos hemorroidários. Deve o leitor também saber que as afecções ano-retais possuem um vocabulário reduzido (sangramento, prurido, prisão de ventre, diarreia, dor, corrimento, puxo, prolapso), e suas poucas palavras (manifestações) tanto podem significar doença benigna como moléstia maligna!

Dados recentes do Instituto Nacional do Câncer, divulgados pela revista “Arq. Gastroenterol” v. 53, nº 2 – abr./jun. 2016, revelam que este tumor foi responsável por aproximadamente 32.000 casos em 2014. Foram 15.000 novos casos em homens, e 17.530 em mulheres. Portanto, olho vivo! Nem tudo o que sangra pelo reto significa hemorroidas. Pode ser câncer!

(*) Professor Emérito da UFC. Titular das Academias Cearense de Letras, de Medicina e de Médicos Escritores.

Fonte: O Povo, Opinião, de 24/8/2016. p.10.

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