Por Affonso Taboza (*)
Primeiros dias de novembro, vitrines em metamorfose. São os ensaios da
melhor temporada de vendas do ano. Pinus elliottii de plástico são vistos em
toda parte.
Árvore nativa do Hemisfério Norte, nada tem a ver com nossa cultura
tropical, mas integra o pacote de Natal que foi por nós absorvido em sua
inteireza com neve, trenó e rena, e mais um velhinho branco de cabelo e barba
de neve, roupa extravagante de seda vermelha, cinturão grosso de fivela grande
e quadrada, entrando pela chaminé das lareiras com um saco de presentes.
Casa brasileira não tem lareira. Menos ainda, chaminé. Mas Natal é isso,
sonho, e foi esse o sonho que se cristalizou em nossas mentes, vindo dos povos
do Norte.
Nos presépios, até as ovelhas e burregos são delicados, angelicais.
Tentativas de tropicalizar o Natal nasceram mortas. Cajueiro? Árvore
seca da caatinga? Isso não é árvore de Natal. Raramente se vê, nas vitrines,
manjedoura com a criancinha de braços abertos, o homenageado da vez. Festeja-se
o seu natalício, mas dele poucos se lembram. Mal se ouve seu nome. A criancinha
não vende. Quem vende é o velhinho do saco de presentes, sutilmente sugerindo
compras.
Noite do dia 24. Família reunida na sala, o pinus se destaca pelo jogo
de luzes e seus enfeites reluzentes. É a peça mais bonita, aquela que dá o
clima. Conversa animada, discreta euforia, músicas especiais, distribuição se
presentes, ceia. Fim de festa.
Alguém se lembrou do nascimento de Jesus? Alguém cresceu espiritualmente
com a festa religiosa? Talvez ninguém. Também, pudera! Não foi festa religiosa.
Foi a festa do comércio.
Uma semana depois, Ano Novo. Roupa nova, de preferência branca. Mas
branca por quê? Sabe-se lá! Falam num culto a Iemanjá, uma entidade religiosa
importada da África. Pra mim, qualquer roupa veste. Nem venham com essa de
uvas. Desde quando mastigar uva na passagem dá sorte o ano inteiro?
Sorte é romper o Ano Novo com o bilhete premiado da Mega Sena no bolso!
O resto são desejos, votos, anseios, que comumente se esvaem nas agruras do dia
a dia, ao longo do feliz ano novo.
Mas e daí? Não se deve festejar a passagem do ano? Claro que sim! Cair
no embalo! Um ano inteiro de porradas, com pequenos intervalos de refresco, é
dose muito forte. Um pouco de fantasia e esperança temperadas com doses de
scotch ou vinho, e o pipocar dos fogos de artifício, ajudam a empurrar o carro
pra frente.
Vamos ao Réveillon!
(*) Coronel Reformado do Exército Brasileiro
e membro do Instituto Histórico, Geográfico e Antropológico do Ceará.
Fonte: Publicado In: O Povo.
Fortaleza, 12/12/2016. Opinião. p.11.
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