Dom Arns é um dos maiores nomes do
episcopado brasileiro que defenderam uma igreja comprometida com os oprimidos.
O
Brasil – e não apenas os católicos – está enlutado pela morte, ontem, do
arcebispo emérito de São Paulo, cardeal dom Paulo Evaristo Arns, um símbolo da
resistência à ditadura civil-militar de 1964 e de defesa dos direitos humanos e
da justiça social. Sua morte ocorre aos 95 anos de idade e após ter completado,
neste ano, 50 anos de ordenação episcopal.
O
cardeal Arns é um dos maiores nomes do episcopado brasileiro que defenderam uma
igreja comprometida com os oprimidos de todos os quadrantes: os sem voz. Foi
incentivador das Comunidades Eclesiais de Base, uma estrutura participativa em
que se procura encarnar os princípios evangélicos na realidade social
circundante, visando transformá-la, como parte do compromisso cristão de amor
ao próximo.
Isso
levou, inevitavelmente, à trombada com o regime ditatorial de então, que
proibia qualquer ativismo social e cidadão. O fato de ajudar na formação da
consciência crítica e incentivar os cidadãos à participação política e à defesa
de seus direitos civis e sociais azedaram sua relação com a ditadura. As coisas
esquentaram bastante quando o jornalista Vladmir Herzog foi assassinado após se
apresentar num quartel do Exército para ser interrogado, depois de comunicar
previamente a iniciativa ao próprio cardeal, por segurança. Ao saber do crime,
dom Paulo, indignado, abriu as portas da Catedral da Sé a um culto ecumênico
que, reuniu milhares de pessoas, num ato que abriu as comportas para a
derrocada do regime.
Em
seguida, foi a vez de o operário Santo Dias, presidente da Pastoral Operária,
ser assassinado pela polícia com um tiro nas costas durante uma manifestação
popular. Sem se deixar intimidar, dom Arns criou o Centro Santo Dias de Defesa
dos Direitos Humanos e a Comissão Justiça e Paz responsável pela publicação do
livro “Brasil: Nunca Mais”, sobre os mortos e desaparecidos na ditadura
militar.
Ironicamente,
dom Paulo morre no mesmo momento em que o Congresso Nacional dá fim ao Estado
Social, pelo qual ele tanto lutara, esvaziando por completo a Constituição de
1988, fruto das conquistas políticas e sociais do povo brasileiro.
Nada
disso, contudo, impedirá que o nome de Paulo Evaristo Arns se eternize na
memória da Nação como um campeão da liberdade, do respeito à dignidade humana e
da justiça social no Brasil.
Fonte: Editorial de O Povo, de 15/12/2016.
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