sexta-feira, 14 de dezembro de 2018

AOS VIVOS: Download de Chifre ... e outros causos


Download de Chifre

Situação complicada a de dona Mimosa – dívidas acumuladas, entre elas energia elétrica e água, aluguel e plano funerário. Simples dicumê do povo casa em falta e gente ‘enloucando’ de aperreio no juízo. Ela desempregada, ventilador quebrado, joelho ‘dismintido’, praga de cururu no terreiro, duas vizinhas ‘imprestáveis’.
Situação complicada a de dona Mimosa – já não dormia, fossa cheia até a tampa, oito goteiras no telhado. Cachorro acuado por praga de carrapato e o time na série D despencando pra E. Marido com uma rapariga no Zé Walter e trabalho feito por sujeita do Ancuri. O filho novo com uma curuba medonha no pescoço...
E quem diria que a solução pudesse vir da curuba medonha no pescoço do filho de dona Mimosa! Como? A rádio anunciou no programa do Jurandir um torneio para a escolha da tatuagem mais animal da cidade. Por tatuagem animal entenda-se: criativa, espontânea, colorida, bem desenhada e a mais natural possível. Dois mil reais ao vencedor.
Foi Mimosa ouvir a propaganda e lembrar-se vexado da curuba no pescoço do menino. Se não tinha todos os pré-requisitos do regulamento, que tal colorir a bichona de violeta genciana? “Vem cá, Mundico!” Pintou a ferida com o “corante primário usado no processo de coloração de Gram”, meteu o rebento numa roupa tinindo de branca, botou um pano por cima (pra ninguém invejar) e foi morta de esperançosa pro campeonato.
Os estilos Old School, New School e Geométricas arrasavam até a hora em que a tatu daquele pescoço cerotento, saindo da reserva, rompeu o anonimato e deixou encantados os jurados e suas próximas oito gerações. Nota 100 em todos os itens. Sobremodo, foi aplaudida (a ‘taturuba’ de Mundico) pelo “referencial angular 3D em alto relevo”. You are the champions entoado pela torcida.
Com os dois mil no bolso, dona Mimosa pagou as contas. Até encomendou baralho novo e TV em cores. A curuba do menino, tratou com o de sempre: cuspe. Sobre a violeta genciana...
- Vou guardar o vrido. Ano que vem tem mais!
“Enceguerado” por elas
Atentemos, com base nesse minúsculo diálogo, a fixação de Tico Lopão pelo mulheril. Conversa entre o amigo, ele e Gildásio, que inicia o bodejado.
- Lopão, viu só o Rodrigo Rocha Loures, caba mais sem futuro?!?
- Fí de quenga!... Por falar nisso, bicho de gabarito é quenga! Gostosa! Precisa conhecer minha vizinha lourona que chegou ontem!
- Vi ela! Mas o Aécio, hein? Sobrinho de finado Tranquedo, como é que pode?
- Pode! Quem pode mesmo é Tonha de Zé Delgado. Que tronco de sedém!
- Homi, tô falando do conluio do Temer, do PMDB e do PSDB pra livrar a cara daquele papangu de lagoa!
- Lagoa! Tô doido tomar banho na lagoa do Tabapuá, nu, com a Bertina filha de dona Raimunda! Ah, par de coxa lindro!
- Ano que vem tem eleição! E esses aí? Num voto em mais nenhum fí rapariga!
- Fale de rapariga na minha frente não, Gildásio! Rapariga é a graça do mundo!
- Dá pra falar contigo não, Lopão. Positivamente, não dá!
- Dá! E se der, eu... vuco!
Perorando
“O pior surdo é o que não quer ouvir história de aparelho de surdez” (João Moquim)
Fonte: O POVO, de 4/11/2017. Coluna “Aos Vivos”, de Tarcísio Matos. p.8.

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