quinta-feira, 11 de abril de 2019

ANSIEDADE E PRÊT-À-PORTER


Meraldo Zisman (*)
Médico-Psicoterapeuta
Do francês ‘prêt’ (PRONTO) e à-porter (PARA LEVAR) …, portanto, ‘prêt-à-porter’, em termos de moda, quer dizer, isso mesmo, pronto para levar…pronto para vestir e usar… produção em série, para baratear o produto, comprar, levar e usar… não há segredo.
E o que tem a ver a moda com a ansiedade? É o que discutirei a seguir.
O prêt-a-porter foi abraçado por grandes estilistas, que acrescentaram valores estéticos aos produtos e isso não causou mal algum. Foi até construtivo. Positivo. Surgiu até uma transformação simbólica, que criou um símbolo de alta classe.
A publicidade aumentou. Grifes que deveriam ser intrinsecamente articuladas para não democratizar algo exclusivo criaram milhares de peças idênticas, industrializadas, que passaram a ser cobiçadas por pessoas no mundo todo. Para recordar: o costume de criar e comprar prêt-à-porter surgiu após a Segunda Guerra Mundial. Dizem até que o fator mais importante para o sucesso da produção de roupa pronta para ser usada foi a concepção estética global que, desde a criação das primeiras butiques, propôs a inclusão de linhas de acessórios, como joias e perfumes.
Como sou psicoterapeuta e não estilista termino esta introdução lembrando uma curiosidade, pelo menos para mim: Pierre Cardin foi o primeiro a abrir um departamento prêt-a-porter (em inglês “ready-to-wear”) na famosa Galeria Printemps, em Paris, no ano de 1959. Por isso foi expulso da Câmara Sindical, responsável por zelar pela alta-costura.
Como não entendo bulhufas de moda masculina e muito menos da feminina, acredito que o sucesso da vestimenta comprada pronta não pode ser culpa da internet, compras virtuais, preços mais baixos, modismo, por estar na onda. Mas não é somente isso: o fato de as pessoas não saberem mais esperar para que a roupa fique pronta leva a uma narrativa, uma construção, baseada na pressa generalizada: o tempo não dá tempo para se fizer tudo o que queremos/somos forçados a fazer.
Creio ser esse um dos motivos ocultos do aumento da ansiedade genérica.
A ansiedade generalizada (CID10 F41.1) é persistente, não ocorre exclusivamente nem mesmo de modo preferencial numa situação determinada (a ansiedade é “flutuante”) e tem de ser tratada e cuidada. É muito sofrida.
Nesta estação Global, tudo é muito rápido, queremos tudo depressa e na hora, temos que escolher entre um grande número de coisas ao mesmo tempo, acelerado, ligeiro, e o nosso aparelho mental ainda não está capacitado a destrinchar tantas coisas ao mesmo tempo.
Espero que na minha vida eu tenha ainda tempo para continuar procurando essa capacitação e para continuar trabalhando nisso (a maioria das pessoas que me procuram são jovens), auxiliando esses jovens a quem me dedico como meta de vida, por sempre tê-los amado de forma respeitosa.
Quando eu falo de jovem não estou falando de idade cronológica.
(*) Professor Titular da Pediatria da Universidade de Pernambuco. Psicoterapeuta. Membro da Sobrames/PE, da União Brasileira de Escritores (UBE) e da Academia Brasileira de Escritores Médicos (ABRAMES). Consultante Honorário da Universidade de Oxford (Grã-Bretanha).

Nenhum comentário:

Postar um comentário