Por Márcia Alcântara Holanda (*)
Quando fui fazer minha primeira
comunhão, ao me confessar pela primeira vez, o pecado apresentado ao pé do
confessionário, foi o de que eu havia mentido para minha avó, quando ela
perguntara certo dia quem havia comido a última fatia dourada que sobrara do
café das três da tarde, e que guardara para uma amiga que iria visitá-la, pelas
cinco. Foi a mim e inquiriu se havia sido eu quem a comera. Respondi que não,
mas comera. Pronto: instalou-se em mim o medo de ser descoberta e a vergonha
por ter cometido esse deplorável ato, que de acordo com os preceitos dela,
mentir prejudica o outro, leva a se fazer atos ilícitos e a ficar-se
desacreditada. Calei-me, carregando comigo o peso do arrependimento e da
vergonha daquela atitude que prejudicara minha avó. Só no escuro do
confessionário consegui revelar minha mentira, e pedir perdão a ela, em
seguida.
Hoje, deparo-me diariamente com um
turbilhão de mentiras postadas na imprensa e redes sociais. Não escapa nenhum
veículo de comunicação que não albergue um número deplorável de declarações
mentirosas, que terminam às vezes sendo assimiladas por seus autores e
interlocutores como verdadeiras. A mentira é a ilusão da verdade, dizem os
psicólogos. Essa estratégia de enganar o outro, anda sendo muito usada
ultimamente. Mente-se por tudo. Não consegui localizar, por exemplo, entre
centenas de corruptos condenados pela Lava Jato, sequer um, que tivesse
confessado seus delitos, muito menos pedido perdão ao povo por atos criminosos,
provados por mecanismos judiciais. A polarização do contrário na política tem
sido um berço para o manancial de mentiras que se geram diariamente, promovendo
o engano, levando a esperanças vãs, desmoronando as atitudes lícitas que
desejamos para atuais e futuros governantes. A mentira parece ser o mote dos
polarizadores políticos. Estar ou alcançar o poder, passa pela mentira contumaz
nos dias de hoje.
Resta-nos usar e abusar de nosso
poder de reflexão e discernimento para não cedermos ao ímpeto tão falso dos
poderes constituídos, que ora se digladiam embasados na mentira acima de tudo e
de todos.
(*) Médica pneumologista; coordenadora do
Pulmocenter; membro da Academia Cearense de Medicina.
Fonte: Publicado In: O Povo, de 2/12/2019. Opinião.
p.20.
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