Pássaro morto, gaiola aberta!
Seu
Zé Duarte, 92 anos de pura brabeza. Caba nascido nas Caraúbas da Caucaia,
comedor de manga jasmim, vendedor de moré (peixe do rio Cauípe conhecido
popularmente por "pomba de padre"). Pela passagem na UTI, ficaram-lhe
algumas marcas; por isso, as gororobas que toma pra derribar a ansiedade. Até
há pouco sondado, dorme com dificuldade em cama, ele que a vida toda deitou-se
em rede.
Precisa
fazer urgente exame de urina, "arde muito quando escorro o cipó,
doutor!". Ele conversa com a cuidadora sobre o sacrifício de coletar o
material.
- Esse copinho plástico pra
pegar o segundo jato de urina na primeira mijada da manhã é muito miudinho.
Será que eu acerto?
- Acerta, e vai ser de prima! Vou lhe dar um papagaio ("recipiente
urinário utilizado para coletar a urina de pessoas acamadas...")... - explicou Jarlenísia.
- Jura?
- Confie em mim, seu Zé! O papagaio tem a boca larga, tá esterilizado.
Se concentre na privada e taque o pau!
- Se é assim...
5
da manhã, um breu em casa. No banheiro, encontramos seu Zé de pé, encostado na
privada, meio bambo das pernas; cuidadora na porta, esperando a consumação.
Para melhor concentrar-se, pede que ela saia. Cinco minutos e nada de seu Zé se
pronunciar com a urina do bendito exame. Enfim, em fala lamentativa, dispara:
- Minha fia!
- O que, seu Zé? Fez?
- Cadê fazer, se não tô
encontrando?...
- O que, hômi?...
- ... O negócio que mija!
Parece que é
de vera!
Vieram
com o bodejado de que cearense tinha origem vinquingue e o revertério na cabeça
do povo tá sendo grande demais. Prova maior é o que tem sucedido ao amigo
Antônio Luiz Mainha. Confesso que tive dó dele. Me mandou duas fotos na frente
duma rapadura legítima do Cariri (escura, dura que nem concreto armado, no
típico formato aqui da gente).
A
primeira chapa é ele antes de saber que tinha descendência nórdica, numa alegria
medonha. Feliz, satisfeito, em paz com um naco de rapadura bailando na boca.
Cearense raiz, da gema, verdadeiro, tinindo, fiel, chupava a rapadura como quem
adentra ao Sétimo Céu. Porém, na segunda fotografia, após descobrir sua origem
nórdica, vemos um Antônio Luiz triste, cabisbaixo, sorumbático, nauseabundo,
como se fosse golfar - além de arreliado e enfezado.
Sugeri-lhe
o nome de um psiquiatra amigo.
Um povo que
não lê
Visita
que se demora já não é essa maravilha toda, e quando já vem melada, então...
João Joaquim chegou "ataiando frango" lá em casa! Boneco federal. Não
lamento por só falar aos gritos, cuspindo na gente, tampouco por ir à geladeira
e comer meu abacate. Lascou foi que, acometido de súbita diarreia, temeroso de
não encontrar papel higiênico no banheiro, arrastou meu livro predileto da
estante. E limpou-se com nove dos 21 capítulos da universal obra, arrancando
folha por folha.
- Fiquei ingriziado, não pelo
livro, mas pelas 32 páginas passadas a limpo!
Fonte: O POVO, de 4/09/2020.
Coluna “Crônicas”, de Tarcísio Matos.
p.2.
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