Por Doutor Cabeto (*)
Assisto
diariamente aos desabafos nas mídias sociais, que me chegam
das mais diversas formas, principalmente pelos propagadores das más notícias, os
verdadeiros pregadores do apocalipse. São, ao meu ver, os profetas das verdades
banais.
Afinal, quem não conhece a realidade social em que
vivemos? Quem não sabe das disparidades, dos grandes aglomerados urbanos? Porém, a
maioria desconhece o porquê dessa realidade.
Repetir, reafirmar somente os defeitos dos gestores,
isoladamente, não colabora com a mudança. Seria providencial fazermos a mea
culpa
como sociedade, ou mesmo individualmente, tão necessária para a
mudança madura e consubstanciada.
Pois, para mudar é sim, preciso muita força e
perseverança, e mais que humildade. Em nada colaboramos ao exaltar truísmos!
Somente preenche o orgulho de quem usa a rede para
a autopromoção, sempre aguardando as palminhas.
O momento exige muito além do que habitualmente
fazemos. Exige capacidade de ceder, de transformar o mindset, a tal mentalidade existente.
Ao meu entendimento, que não é absoluto, ou
inquestionável, obviamente, as mudanças passam pelas formas de estabelecer
poder no âmbito social.
Traduzindo num aspecto, somente, a forma
de ocupação das cidades, ou da especulação imobiliária, que estabelece um
lobby, nos estatutos municipais, e aumenta, há décadas, a marginalização de
parte da nossa sociedade. É, simplesmente, gentrificação!
O mesmo raciocínio pode ser utilizado para o
incentivo, e a forma de desenvolvimento regional, que precisa priorizar
processos mais inclusivos de áreas menos abastadas.
Um exemplo de política pública exitosa é a
forma de aplicação do ICMS na educação do Ceará, nas últimas décadas.
Você sabia que de forma similar, na saúde do Ceará,
desde 2020, os repasses do ICMS aumentaram de 5% para 13%? E que são vinculados
às metas de desempenho estabelecidas por região de saúde e por município? Que o
estado do Ceará aprovou uma lei, única no Brasil, para garantir ações e
distribuição de recursos para atender 90% dos problemas na própria região de
saúde? Ou seja, mais recursos para quem tem menos estrutura. Que 18 das 21 áreas
descentralizadas do estado já possuem UTIs (anteriormente eram somente 3
municípios)?
Política pública se faz com coragem e com
dignidade. Dignidade para reconhecer o que dar certo, e para propor mudanças
estruturadas, sem casuísmos.
Pois, as rupturas estabelecem conflitos,
que podem ser atenuados pelas pessoas dispostas a essa mudança paradigmática.
Muitas vezes dói muito, quando modifica, ou propõe
rever o status quo perverso que aceitamos nos diversos segmentos. Afinal, como
dizia meu tio querido, Roberto Martins, nenhum dos nossos representantes
veio de marte, não são ETs, são frutos das nossas casas, das nossas
comunidades.
Por isso, a mea
culpa é importante, não vamos cair na conversa daqueles truistas das
verdades absolutas, eles somente encrespam as diferenças e esvaziam o debate
legitimo e democrático.
Por favor, não construam "Genis" (referência
à música Geni e o Zepelim) para justificarem as próprias falhas. Vamos
propiciar esse "turn arround", que parte de nós realmente deseja. Não
vamos pregar a confusão sem aceitar participar da discussão. Enfim, a luta
continua!
(*) Médico. Professor da UFC. Secretário Estadual de
Saúde do Ceará.
Fonte: Publicado In: O Povo, de
25/3/21. Opinião, p.21.
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