terça-feira, 18 de maio de 2021

O PREÇO QUE PAGAMOS PELA POLITIZAÇÃO DA PANDEMIA

Por Monalisa Torres (*)

Há um ano confirmavam-se as primeiras mortes por Covid19 no Brasil. Àquela altura, muitos países já sofriam com o colapso do sistema de saúde e presenciavam seus cidadãos morrerem às centenas.

A adoção de medidas como controle de circulação de pessoas foram alternativas eficazes para reduzir a velocidade da tragédia enquanto governos organizavam estratégias de contra-ataque.

Por aqui, o presidente Jair Bolsonaro (sem partido), em pronunciamento oficial (24/03/20), chamou o coronavírus de "gripezinha", condenou governadores que decretaram isolamento social e citou o uso cloroquina como tratamento para Covid19. Naquele momento, ficou claro que o presidente politizaria as medidas contra a pandemia.

Em sua narrativa tresloucada, afirmou que a opção de governadores em adotar lockdown tratava-se de boicote ao governo federal no plano econômico.

A cobertura da mídia sobre a maior crise sanitária não passava de exagero da "imprensa mentirosa", cujo objetivo seria desgastá-lo no plano político. Apostou no "tratamento precoce" que, segundo ele, protegeria as pessoas para manter a economia funcionando.

No Ceará alguns políticos compraram a tese. Cito dois: o deputado federal Capitão Wagner (Pros) e o senador Eduardo Girão (Pode).

Opositores ao governo do Estado, ambos são contrários ao lockdown. Argumentam que trabalhador e empresário não podem ser penalizados. Em artigo no O POVO (13/03), Girão chegou a questionar a eficácia da vacina e a defender "tratamento precoce".

A politização da pandemia não se restringe ao aspecto discursivo, mas também produz efeitos práticos sobre as políticas públicas como a falta de coordenação nacional no enfrentamento à pandemia, letargia quanto ao plano nacional de imunização, quantidade reduzida de recursos enviados aos estados, etc.

Comportamento também observado em relação a parlamentares quando, por questões políticas, recusam-se a enviar recursos de suas emendas parlamentares para gastos com saúde em seus estados.

Numa democracia, o papel da oposição é fazer contraponto aos governos e propor alternativas. Mas em tempos como esse, é também unir forças contra o inimigo em comum: a Covid. Parafraseando Wagner, "o bem maior que é a vida, não pode se sobrepor à politicagem". Falta ao deputado (e seu grupo) seguir o próprio conselho. 

(*) Cientista política. Professora da Uece. Pesquisadora do Lapem/UFC.

Fonte: Publicado In: O Povo, de 27/3/21. Opinião, p.21.

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