Procura-se uma
doença!
Ó
o tamanho do juízo do Zé de Mafa, ilustre pedreiro da Bela Vista?!? Desejou ser
portador dalguma doença enquadrável no rol das comorbidades só para ter direito
a receber a vacina. Idade, não tinha ainda para recebê-la. Só se fosse por
comorbidades...
Tudo
começou nas costumeiras andanças pelo bairro. Ao cruzar o posto de saúde
coalhado de gente por volta das 11, com a máscara debaixo do queixo,
"embiocou" no recinto e socou-se numa fila. Atendente, prancheta em
mão com inúmeros nomes, indaga gentil do gaiato cidadão que tinha já tomado
umas lapadas no bar do Toinho:
-
O senhor tá agendado pra tomar sua dose hoje?
-
Eu vivo agendado, filha!
-
Nome, por gentileza! E idade!
-
Zé de Mafa! 45 'parabênsis'!
-
Alguma comorbidade?
-
Que é isso, no jogo do bicho?
-
Tem problema cardíaco, pulmonar, diabetes, hipertensão arterial?
-
Assim, pêi bufo, eu não sei dizer. Mas deixa eu raciocinar...
Diálogo
transcorria compreensivelmente alegre (atendente entende que o indivíduo tá
melado), quando Zé de Mafa sustenta tese até então desconhecida da comunidade
científica local:
-
Tenho isso tudo aí, filha: a pitirica lasca meu pulmão; a curuba arromba o
coração do póbi; farnizim no juízo é mêi grau pra diabetes; e a liseira ainda
mata de hipertensão esse que vos implora...
-
Desculpe, senhor, mas seu nome não consta da lista.
Nem
tanto pela ruma de gente que passa na frente dele e adentra ao ambiente
seguinte para aguardar a vez de ser vacinada, mas pelo pé de siriguela que
divisa no quintal do posto, Zé de Mafa é agora todo entendimento acerca das
ponderações da moça. E prova toda a boa-vontade, dizendo de ôi arregalado:
-
Filha, me permita pegar duas siriguelas ali no quintal! Que já me sinto
imunizado!
Um olho no sino e
outro no Papa
Serra
do Marinheiro - simpática localidade de Maranguape do mestre Chico Anysio. Já
lá se vão 50 e tantos anos do dilema vivido pelo coroinha Francisco de Assis,
por ocasião de um dos momentos mais sublimes da celebração: a consagração. O
ajudante do padre, encarregado de tocar o sino, se enrolava todo em três
ocasiões, faltando-lhe sincronia:
-
Quando o sacerdote fazia a primeira genuflexão, antes de elevar; quando a
Hóstia/o Cálice estava elevada(o); quando o sacerdote fazia a segunda dobrada
de perna, depois de elevar.
Francisco
simplesmente esquecia de acionar a sineta, alertando os fiéis para que se
ajoelhassem, herança dos tempos das missas em latim, em que o celebrante
punha-se de costas para os fieis. Cabisbaixo, ligado na santa fala do batina, o
coroinha sempre passava batido. Sino era tocado sempre antes ou depois do
momento oportuno. Percebendo a mudez do singelo instrumento, o padre batia o pé
no chão reiteradas vezes, como dissesse: "Ó o serviço, rapaz!!!" Só
então o sino era tocado.
-
Francisco, você tem se 'ispicializar'! Prestenção!
-
É que eu fico tão 'intirtido' na celebração que se esqueço! Tem jeito, padre?
-
Tem! Um olho na missa e outro no padre!
-
Ou então o senhor amarra um cordão na minha orelha e dá uma puxadinha na hora
em que falar 'este é o meu sangue, o sangue da nova e eterna aliança'...
-
É, Francisco, você tá certo! Quem tá errado é o Papa!
Fonte: O POVO, de 13/5/2021. Coluna “Crônicas”, de Tarcísio Matos. p.2.
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