Por André Costa (*)
O
Brasil ultrapassou a inacreditável quantidade de 516 mil óbitos por covid-19.
Isso mesmo: mais de meio milhão de mortes.
Somos
o segundo país com maior número de falecidos e o terceiro em infectados
pelo coronavírus no mundo.
Não
são apenas números. São pessoas. Pais, mães, filhos, parentes,
amigos, colegas e conhecidos.
Todas
vítimas de uma pandemia que poderia ter sido combatida com eficácia acaso a
aposta nos negacionismos e no charlatanismo não fosse
transformada numa política de governo.
Parece
óbvio, mas para desnaturalizar essa tragédia nacional tenho me
socorrido de simples comparações com o objetivo de demonstrar que as marionetes
de "fake news" menosprezam as vidas humanas.
Por
ignorância ou má-fé não param para refletir sobre o que representam essas
mortes para além da dor e do luto de quem perdeu pessoas
queridas.
Deveriam
fazer contas simples. Por exemplo: 500 mil óbitos são 100 conjuntos de
5.000 pessoas mortas ou de caixões.
Significa
a queda de 2500 aviões comerciais entre 2020 e 2021: uma média diária de
9 desastres aéreos.
Imaginemos:
as mortes por coronavírus se assemelham a quantas catástrofes da derrubada
das Torres Gêmeas (EUA), dos rompimentos das barragens de Mariana e
de Brumadinho, este considerado o "maior acidente de trabalho no Brasil em
perda de vidas humanas e o segundo maior desastre industrial do século com 270
mortos, incluindo 10 desaparecidos"? Simbolizam quantos acidentes aéreos
que envolveu o time da Chapecoense?
Imagino
que a não visualização dos corpos sem vida ajuda nesse perverso processo
de insensibilidade capitaneado por aqueles que são responsáveis por essa
barbárie.
Muitas
vezes ou quase sempre, a imagem é tudo. Vivemos uma espécie de "banalização do
mal" (Hannah Arendt).
Entre
deboches e ironias, mentiras e canalhices e até de imitações
de pessoas sufocadas, seguimos em frente como se a vida não tivesse valor algum
ou nada estivesse acontecendo ao nosso redor.
Precisamos
recuperar a nossa capacidade de solidariedade diante da dor do
outro. O que nos faz humano é a nossa dignidade.
Na
sua "Fundamentação da Metafísica dos Costume", Imannuel Kant,
nos ensinou que tudo em nossa existência tem um preço ou um valor. Quando algo
tem preço ele é negociável e pode ser trocada por outra coisa. Quando algo não
pode ser precificado ou trocado por outra coisa, ele tem valor.
Isso
caracteriza a vida humana. Esta é um valor em si mesmo e não deve
ser banalizada e jogadas fora como se fosse um mero objeto.
Mais
de 500 mil vidas humanas foram descartadas por comportamentos e decisões
políticas baseadas em escolhas irresponsáveis e criminosas.
Os
negacionismos da pandemia e da ciência influenciaram
diretamente para alcançamos esses resultados mortais. Nada disso pode ser
relevado ou esquecido em face das denúncias sobre corrupção, desvios ou
prevaricação.
A
sociedade e as instituições republicanas devem promover as
responsabilizações política, civil e criminal de todos aqueles que contribuíram
para esse genocídio.
É
o mínimo que podemos fazer pelas pessoas que partiram cedo demais.
(*)
Advogado. Conselheiro federal da OAB e
presidente do Instituto Cearense de Direito Eleitoral.
Fonte: Publicado In: O Povo, de 1/7/21. Opinião, p.19.
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