Por Vladimir Spinelli Chagas (*)
Neste 26 de dezembro, o Sul da Bahia foi surpreendido com o
avanço avassalador das águas do Rio Cachoeira, em direção à sua foz no Oceano
Atlântico, em Ilhéus.
Em minha Itabuna, onde o Cachoeira divide a cidade em dois lados, essas cheias trazem
muitos transtornos. Rapidamente as águas atingem as casas mais ribeirinhas e
logo chegam à zona do comércio, na principal avenida, a Cinquentenário.
Esta é a época em que o rio faz esses espetáculos e
assim tem sido desde que Itabuna ainda era Tabocas, com o registro de algumas cheias importantes.
A deste ano traz um rol de lembranças muito fortes
de exatos 54 anos atrás, quando o Cachoeira apossou-se de grande parte da
cidade, espraiando suas águas em todas as direções e atingindo níveis ainda
recordes: a enchente de 1967.
Eu vivenciei a maior de suas cheias. Na noite de 26
eu saia da casa da namorada, na Cinquentenário. Chuva miúda, mas um avanço de águas por conta das precipitações
em suas cabeceiras, quando ainda é Rio Colônia.
Percebendo esse rápido subir das águas, passei na
agência do banco em que era subgerente para ver a situação. A água já começara a invadir. De imediato fui à residência do
gerente, peguei as chaves, voltei à agência, abri as portas e pus-me a colocar,
principalmente os papeis importantes, em locais mais elevados.
Em poucas horas precisei suspender a lida, pois as
águas já me passavam da cintura. Ao sair, estavam na altura do peito e eu
ilhado. Não tinha como ir para casa. Não havia acesso. Noite em claro, na Praça Adami, com tantos
outros surpreendidos por aquele fenômeno.
Pela manhã, na tentativa de atravessar a
Cinquentenário, fui arrastado pela correnteza. No risco, surpreendentemente fiquei calmo e pude
aflorar à superfície, me agarrar ao toldo de um açougue e chegar ao telhado.
Dali fui resgatado com o auxílio de uma boia.
O Senhor Gonçalves, que providenciou esse resgate,
deu-me abrigo em seu apartamento durante todo o dia. No início da noite, com as águas já
escoadas, pude
enfim ir para casa, onde meus pais e irmã me esperavam ansiosos. Afinal, não
tínhamos telefone e não existiam celulares...
(*) Professor
da Uece, membro da Academia Cearense de Administração (Acad) e conselheiro do
CRA-CE.
Fonte: Publicado In: O Povo, de 31/01/22. Opinião, p.18.
Nenhum comentário:
Postar um comentário