Por Tales de Sá
Cavalcante (*)
O cenário era o Alabama, nos EUA, em 1952. Os olhos
de Martha
Tucker, 25 anos,
remetiam a visão para o coração, que palpitava. Sua paixão lembrava a que Tom
Jobim expressa em "Wave": "Os olhos já não podem ver/Coisas que
só o coração pode entender/Fundamental é mesmo o amor/ É impossível ser feliz
sozinho."
A protagonista real tornou os sonhos de encanto, namoro e noivado
também reais. Agora, dar-se-ia o maior deles. Dominava-a a sensação só vivida
por pessoa que ama, ou está apaixonada ou já esteve, sobretudo quando prestes a
se casar. Mas nem tudo são flores, principalmente naquele local, naquela época.
Por ser afro-americana, Martha não acessava ônibus,
toaletes, escolas, médicos, hospitais ou qualquer ambiente exclusivo de
brancos, além de, como os seus semelhantes, poder ser vítima de violência,
prisões indevidas e várias outras discriminações. Em todas as lojas que vendiam
vestidos de noiva e foram por ela visitadas, não entravam pessoas da sua cor. A solução foi usar, no
casamento, uma vestimenta azul doada por familiares.
Recentemente, ela confessou à neta Angela Strozier
não ter realizado o seu grande sonho de usar uma veste de noiva. Angela decidiu
dar à avó de 94 anos um dia de noiva completo - com direito a "make". Quando,
já pronta, se viu no espelho, a anciã afirmou: "Olha para mim." Uma
das nubentes que lá estavam chorou. Martha revelou à neta: "Eu sempre quis
experimentar um vestido de noiva. Aos 94 anos, senti que ia me casar. Eu não queria
tirá-lo. Eu ficava bem nele. E me perguntei como seria a minha aparência,
caminhando pelo corredor. Foi emocionante."
Em 28 de agosto de 1963, Martin Luther King pronunciou seu histórico
discurso para cerca de 250 mil pessoas. Ao ecoar um grito de guerra em prol da
paz. Disse-o: "I have a dream (Eu tenho um sonho)" e rogou, entre
outros desejos: "meus quatro filhos pequenos viverão um dia numa nação
onde não serão julgados pela cor de sua pele, mas pelo conteúdo de seu
caráter".
Tantos anos depois, sabemos que o sonho de Martha
foi realizado, mas os de Mr. King, não. Já é tempo de o grande líder ser atendido.
(*)
Reitor do FB UNI e Dir. Superintendente
da Org. Educ. Farias Brito. Membro da Academia Cearense de Letras.
Fonte: Publicado In: O Povo, de 10/02/22. Opinião, p.18.
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