segunda-feira, 4 de julho de 2022

EDUCAÇÃO DOMICILIAR, ISOLAMENTO E SEGREGAÇÃO

Por Eloisa Vidal (*)

A recente proposta aprovada pela Câmara Federal sobre o ensino domiciliar, o também conhecido homeschooling, traz à tona a preservação de um dos pilares que fundamenta a educação brasileira, conforme está previsto na LDB, de que "a educação, dever da família e do Estado, inspirada nos princípios de liberdade e nos ideais de solidariedade humana, tem por finalidade o pleno desenvolvimento do educando, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho" (art. 2º). Quando se opta por uma educação domiciliar, a abrangência deste artigo é seriamente ameaçada, afetando as potencialidades das crianças e jovens adolescentes que ficam privados das interações sociais, emocionais e pedagógicas que só o ambiente escolar pode propiciar.

Um dos argumentos que sustenta a defesa da educação domiciliar é a preservação dos valores familiares e da não contaminação das crianças com ideologias diversas. Nesse sentido, coloca-se como uma proposta excludente, em que se priva novas gerações de acesso a conhecimentos e possibilidades de escolhas. Isso leva ao fomento de intolerâncias, fundamentalismos, preconceitos e segregacionismos. E contamina o tecido social e a vida em sociedade, uma vez começam se formar grupos que têm nas suas regras de organização e convivência a negação das diferenças, das diversidades e o não reconhecimento das regras que pautam o contrato social, especialmente, nas sociedades democráticas.

Outro aspecto da proposta da Câmara diz respeito a exigência de pessoa com formação de nível superior no domicílio para que seja possível o homeschooling. Estamos falando de uma proposta de educação para poucas residências, considerando que a grande maioria dos lares brasileiros é formado por pais que, quando muito, possuem o ensino médio completo. A proposta ataca de forma descarada a profissão docente, uma vez que a exigência é genérica quanto a formação de nível superior e a legislação educacional brasileira exige formação de nível superior em licenciatura, para assumir a docência na educação básica. Você pediria a um engenheiro civil para fazer uma cirurgia numa perna quebrada? Ou chamaria um médico para consertar a instalação elétrica da sua casa? E por que ambos podem assumir a tarefa de ensinar um extenso currículo envolvendo vários conteúdos que vão da matemática às artes?

(*) Professora da Uece. Doutora em Educação.

Fonte: Publicado In: O Povo, de 17/06/22. Opinião, p.15.

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