Por Carlos Roberto Martins
Rodrigues Sobrinho (Doutor Cabeto) (*)
A saúde pública
está entre as principais demandas da sociedade brasileira. No entanto, às
vésperas das eleições não assistimos a nenhuma proposta dos candidatos a
presidente da república, mesmo diante da tragédia que vivemos com
a pandemia da Covid 19.
Da mesma forma,
apesar da demonstração evidente da fragilidade dos nossos sistemas de saúde
público e privado, é evidente a omissão das universidades, dos sindicatos, dos
conselhos, ou seja, dos órgãos de representação de classe referente à análise e
ao debate de reformas conceituais, urgentes.
Mas, o que está
tão óbvio? A desigualdade entre as regiões é evidente quando
avaliamos qualquer aspecto, desde a infraestrutura física e de recursos humanos
até a ausência de equidade na distribuição de recursos federais. A diferença da
relação de leitos de UTI per capita exemplifica essa distorção. Estão
localizadas no Nordeste as regiões com mais de 200 mil habitantes que não
possuíam nenhum leito de UTI até o ano passado.
A ausência de
uma política pública de recursos humanos, a defasagem tecnológica das
nossas unidades de saúde, e principalmente, a ausência de um sistema de
inteligência e transparência de dados que permitam conhecer a realidade das
problemáticas que mais nos aflige, protagonizam, consequentemente, uma
ineficiência escandalosa da aplicação dos gastos públicos em saúde.
Nesse aspecto,
muito se fala sobre os reduzidos recursos para a saúde, mas nada se diz sobre
a precarização da força de trabalho, sobre o clientelismo
e o aparelhamento ideológico do nosso SUS. Pois bem, infelizmente esse
slogan: "o SUS é dos brasileiros" não é verídico; no momento, o SUS
pertence aos comensais do sistema, as corporações e aos políticos que
tradicionalmente exercitam o toma lá dá cá em todos os níveis de atenção, da
rede primária à terciária.
Há, certamente,
um ufanismo sobre o nosso sistema. É simples, que modelo é esse que
não atende às necessidades dos clientes e dos trabalhadores da saúde? Não há
dados sobre eficiência do atendimento ou mesmo sobre o impacto de políticas de
doenças muito frequentes, como a hipertensão arterial.
Assistimos aos
teóricos e gestores da saúde defenderem estratégias sem resultados.
De nada adianta
dizer “eu defendo o SUS”, se não entendermos que urge a implantação
de transparência de dados de eficiência da nossa rede, se não aplicarmos
recursos com equidade entre as regiões do Brasil, ou mesmo no interior de cada
Estado, se não aplicarmos e incentivarmos a garantia da qualidade do sistema
público e também do privado, se não tornarmos obrigatória e disponível a
formação com residência em saúde e médica, se não extinguirmos a precarização
do trabalho na saúde. No Ceará, cerca de 80% dos trabalhadores da saúde têm
vínculos empregatícios precarizados. E a maioria dos médicos formados no Brasil
atual não possuem título de residência. 46% dos médicos no Brasil têm titulo de
especialista emitido por sociedade de especialidade ou obtido após conclusão de
Residência Médica.
A ineficiência
do gasto público na saúde é um câncer
refratário a
tratamentos disponíveis na política brasileira atual e na história mais
recente. Apenas em 2017, segundo André Medici, essas ineficiências somavam R$
35,8 bilhões. Ou seja, representam o equivalente a dez anos de gasto público em
saúde do Ceará.
Milhares
usurpam de jargões para esconderem a ausência de competência na gestão pública.
Não há planejamento para o curto e médio prazos. Os orçamentos públicos não obedecem a qualquer critério de viabilidade, grande parte da
aplicação dos recursos é usado para seduzir prefeitos, deputados e vereadores.
Não podemos confundir projetos de crise com elaboração de uma política de
Estado. Por exemplo, o programa Mais Médicos é uma estratégia de crise e não uma política de Estado como a opção
pela formação e fixação de talentos e de gestão e desenvolvimento de pessoas.
Assim, é evidente a demonstração que não há nenhuma garantia de conformidade
ética e Jurídica no serviço público de saúde no Brasil.
Enfim, se
mantivermos essa realidade aprofundaremos a desigualdade e a perversa falta de acesso às populações mais dependentes do SUS.
(*) Médico. Professor da UFC. Ex-Secretário
Estadual de Saúde do Ceará.
Fonte: Publicado In: O Povo, de 7/09/2022. Opinião. p.21.
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