Por Pe. Eugênio Pacelli SJ (*)
Há dois anos moro no Mosteiro dos Jesuítas, em Baturité,
lugar mais privilegiado e lindo de todo o maciço. Lugar rico em histórias,
lembranças, cultura, religiosidade, de natureza exuberante, que favorece um
encontro consigo, com os outros e com Deus. É difícil entrar no mosteiro sem
sentir, falar e saborear o mistério inesgotável que nomeamos: Deus. Há uma
sintonia profunda entre espiritualidade e natureza.
A Criação é um imenso altar, no qual podemos contemplar a
presença do Criador. O Papa Francisco na Laudato si' n. 84 afirma:
"Todo o universo material é uma linguagem do amor de Deus, do seu carinho
sem medida por nós. O solo, a água, as montanhas: tudo é carícia de Deus".
A Criação, portanto, é um grande sacramento e se transforma no espaço e no lugar
de manifestação da divindade. Tudo é sagrado; Matéria e Natureza porque é o
Templo de Deus. São "territórios sagrados" onde Deus tem prazer de
passear e de encontrar-se com o homem dando-lhe a missão de "cultivar e
guardar a Criação" (Gn 2,15)
Inácio de Loyola, mestre da espiritualidade, via bondade e
beleza em todas as criaturas. Cada criatura torna-se uma revelação de Deus,
tudo manifesta e revela o seu Amor, causa admiração e encantamento e leva a
descobrir as pegadas do Criador nas criaturas. Diante das obras criadas é
necessário uma "atitude contemplativa" que desperta os sentidos e os
envolve na busca de Deus. Aqueles que tem os olhos iluminados pela fé conseguem
saborear as manifestações de Deus em tudo e em todos.
Neste sentido, uma espiritualidade sadia e integral
ajuda a superar as dicotomias na busca da unidade e da totalidade: ciência e
mística, mundo físico e espiritual, corpo e espírito, céu e terra... tudo se
encontra em profunda harmonia e íntima intercomunicação, que cura em nós tal
dicotomia que tem provocado toda espécie de mal-estar, de doenças, de
insegurança, de ansiedade.
Uma espiritualidade que se opõe ao utilitarismo e à depredação
da natureza. Na qual a natureza não é vista como uma mediação criada só para
servir ao ser humano, mas um lugar e meio para "louvar, reverenciar e
servir o Criador". Aqui, já não cabe mais nenhuma atitude de dominação,
exploração e depredação. O cuidado e a beleza do universo impõem-se ao desejo
consumista desenfreado, desencadeando um novo paradigma de relacionamento com o
conjunto da Criação.
Quem tem a graça de sair do asfalto, desacelerar, fugir do
barulho e despertar os sentidos com a luz da fé verá toda beleza, originalidade
e grandeza da criação como teatro da glória de Deus. Além de se sentir
parte integrante desta obra, será também corresponsável por ela. Permita-se
fazer esta experiência.
(*) Sacerdote jesuíta e mestre em Teologia. Diretor do
Seminário Apostólico de Baturité.
Fonte: O Povo, de 11/02/2023.
Opinião. p.18.
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