Com vistas a angariar apoio para o XII
Congresso Brasileiro de Cancerologia, que seria realizado em Fortaleza, em
novembro de 1991, o Prof. Haroldo Juaçaba, em companhia de membros da Comissão
Organizadora do evento, foi recebido em palácio, por uma autoridade pública
local.
A conversa foi infrutífera, muito pouco
rendendo pelo caráter dispersivo de nosso interlocutor, o gestor
Duas décadas decorridas, guardo vagas
lembranças daqueles diálogos, mais ou menos assim:
– Nós estamos aqui, em comissão, conforme
ofício que solicitou esta audiência, para falar do XII Congresso Brasileiro de Cancerologia...
– Ah, é uma honra receber, em meu modesto
gabinete, o exímio cirurgião Haroldo
Juaçaba e seus colegas do congresso –
demonstrando um inicial apreço pelos visitantes.
– O senhor, ao percorrer nossa cidade, já deve ter visto os
“outdoors” espalhados, dando conta da realização do nosso congresso no próximo
mês de...
– A propósito, vocês já viram a maquete da
nossa principal obra? Tá uma belezura! – Apontando
a maquete, posta em uma mesa ao lado, e protegida por uma redoma de acrílico.
Em deferência ao convite, o grupo de médicos
deixou a mesa de reuniões e foi conferir a maquete, causando um contentamento
ímpar no anfitrião. Ao retornarem ao local da reunião, o Dr. Juaçaba tenta
retomar a conversa interrompida:
– Pois, como estávamos falando, em novembro
vindouro, Fortaleza acolherá mais de mil congressistas de todo o Brasil...
– Vejam as plantas com os detalhes da grande
obra, que legarei aos cearenses – remetendo os
médicos para verificarem quatro plantas que emolduravam as paredes do gabinete,
interceptando novamente o fluxo da conversa.
Depois dessa segunda intromissão, de novo
reunidos à volta da mesa, o Dr. Haroldo retorna ao cerne da audiência:
– O nosso congresso assumiu uma enorme
dimensão, patenteada pela presença confirmada de vinte e cinco conferencistas
internacionais e de mais de cinquenta palestrantes nacionais. Tudo isso impõe
despesas de vulto, e, por consequência, a captação de somas...
O gestor público não esperou sequer o Prof.
Haroldo Juaçaba completar a frase, e, muito menos, apresentar qualquer pedido.
Em tom de provocação, continuou:
– Sabem bem vocês em quanto está orçada a
nossa obra? É tanto dinheiro que o erário ficará combalido se tiver que arcar
com tudo. A minha esperança é que o governo federal injete recursos, por meio
das emendas de bancada de nossos deputados.
Após muito lero-lero, o máximo que se conseguiu
dessa autoridade foi o compromisso de assumir pagamento de algumas inscrições
de funcionários públicos no congresso e a promessa de que se faria presente na
solenidade de abertura do evento.
*
Publicado, originalmente, In: SILVA, M.G.C. da. Contando Causos: de médicos e
de mestres. Fortaleza: Expressão, 2011.112p. p.33-34.
Fonte:
SILVA, M.G.C. da. Congresso de cancerologia. In:
SOBRAMES – CEARÁ. A plenos pulmões. Fortaleza: Sobrames-CE/Expressão,
2021. 340p. p. 230-231.
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