Por Cláudia Leitão (*)
O social é sempre emergente e, por isso, encontrá-lo é um exercício
de revelar o invisível, de mirar o pequeno de uma forma a fazê-lo maior e mais
significativo, de conectá-lo com mais vigor na rede. Encontrar o
social é, mesmo, um grande exercício de imaginação. Afinal, o desafio da
construção de novos mundos a partir do agir na rede, implica na oferta de novos
repertórios, de novos atores naturalmente marginalizados e invisibilizados.
A esse respeito, o princípio da biodiversidade cultural é
essencial na ampliação dos atores-rede não humanos, fazendo da economia
criativa um eixo estratégico para um novo desenvolvimento brasileiro.
Bruno Latour faz um chamamento aos novos coletivos, para que venham
socorrer o Ocidente, sobretudo, àqueles considerados arcaicos e pré-modernos. O
alerta de Latour, sobre o papel regenerador das comunidades
tradicionais que ainda não foram varridas da Terra, em função dos
desmandos do Antropoceno, também é uma convocação às epistemologias do Sul, um
reconhecimento da pluralidade de seus valores e imaginários essenciais à
regeneração dos seres vivos.
"Cessar de modernizar para ecologizar", conforme observa
Eduardo Viveiros de Castro, também nos serve de alerta diante do esgotamento
dos modos de viver da modernidade-mundo, que perverteu os sentidos do
"criar" para os de "destruir", simbolizado pela imagem
proposta por Davi Kopenawa, de um céu prestes a cair.
Em um mundo de indiferenças entre seres vivos, somente uma
imaginação ativista, oriunda de uma cosmopolítica, pode redimir o planeta
de um futuro funesto e trazer de volta os sentidos da Terra para os seres
vivos.
Em agosto desse ano, a Lei dos Mestres da Cultura Tradicional
Popular do Ceará celebra 20 anos de existência. Tenho imenso orgulho de ter,
como secretária de cultura, provocado o Estado a agir na valorização e
proteção dos "tesouros vivos". Afinal, são as comunidades
tradicionais que integram casa, ofício, religião, trabalho, lazer e cuidados em
torno do bem comum, ensinando-nos, sobretudo, a conviver.
(*) Cientista Social. Ex-secretária de Cultura do Estado do Ceará.
Professora da Uece.
Fonte: Publicado In: O Povo, de 9/07/23. Opinião. p.20.
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