terça-feira, 16 de abril de 2024

A arte em barro das Cândido e João Pedro do Juazeiro

Por Izabel Gurgel (*)

Todas as vezes que cheguei à casa 55 da rua Boa Vista, no Centro de Juazeiro do Norte, encontrei pelo menos uma Maria, e quase sempre mais de uma, com a mão na massa. A visita não interrompe o trabalho. Uma casa-ateliê, a da família da mestra Maria de Lourdes Cândido Monteiro (1939 - 2021) e João Américo Cândido afirma a força da incidência, na vida do lugar, da máxima beneditina 'oração e trabalho', santos óleos irrigadores da convocação feita por Padre Cícero: "Tragam sua arte para o Juazeiro do Norte".

Escutei a frase acima de Renato Dantas em uma tarde de julho de 2004, no antigo Grupo Escolar Padre Cícero, no bairro do Socorro. O minicurso fazia parte do "III Simpósio Internacional sobre o Padre Cícero do Juazeiro: e... quem é ele?". Renato citava depoimento da professora Generosa Alencar, uma das órfãs criadas por Padre Cícero, à curadora de artes visuais Dodora Guimarães.

"Em cada casa, um altar e uma oficina", dizia Renato, convidando-nos a olhar a cidade a partir d"A influência do Padre Cícero na arte popular". Na mesma sala, ao lado do amigo pesquisador, Gilmar de Carvalho (1949-2021) nos oferecia "Altares e Oficinas": "Juazeiro tem uma expressão de arte e artesanato; aquela baseada na invenção, este, na habilidade, que desconcerta qualquer expectativa que se faça". Releio nos anais do encontro realizado pela Urca e Diocese do Crato. Publicação organizada por Annette Dumoulin, Ana Tereza Guimarães e Maria do Carmo Forti.

Juazeiro teria sua gênese incessantemente recriada por mulheres e homens como as gentes da família Cândido (arte em barro), cujas moradias são oficinas, lugar de fazer as coisas do mundo. Um saber fazer que se realiza no cotidiano, escala humana forjada na necessidade, mãe e pai e rebento de toda criação. Desejo, necessidade, vontade, como na canção dos Titãns.

Agora me ocorre a casa-ateliê do mestre xilógrafo Stênio Diniz. Guarde o endereço: rua Coronel Raul, 549, no Pio XII. Desejo que você possa um dia usá-lo, como sugere o poeta Antônio Cícero no poema "Guardar", e se dê um presente, indo até lá. A caminho da casa do Stênio, em fevereiro de 2023, João Pedro do Juazeiro me disse: "Na xilo, é o melhor de todos nós".

João Pedro, que nasceu em Ipaumirim, quer refazer, em livro, parte dos caminhos por ele percorridos na cidade onde se criou. O Livro das Cândido, como se refere à publicação que sonha ver materializada, é o primeiro de uma série sobre seus pares, mulheres e homens que, na invenção de si e da sustentação da existência, zelam e velam pela alegria do mundo.

Frutos da cidade-árvore, João Pedro e Célia Carvalho tornam oficina cada casa da família em Fortaleza, onde moram há mais de vinte anos. O sempre itinerante João Pedro precisa do nosso apoio para tornar possível sua recuperação de um AVC. Valendo mais do que nunca a máxima 'fé e trabalho'. João Pedro entra com o trabalho. E nossa melhor oração é comprar xilos e livros da sua lavra. Pela primeira vez, cheguei à casa dele e não o vi fazendo, riscando na madeira, imprimindo. Entre o Centro e Jacarecanga, a casa é a de número 190 da rua Agapito dos Santos.

(*) Jornalista de O Povo.

Fonte: Publicado In: O Povo, de 17/03/24. Vida & Arte, p.2.

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