Pedro
Henrique Saraiva Leão (*)
Nas
faculdades de Medicina, cedo os alunos conhecem os quatro sinais
característicos da inflamação aguda: rubor, tumor, calor e dor. É o chamado
quadrilátero de Celsus. Cornelius Celsus (530 a.C – 7 d.C), nobre leigo durante
o reinado de Tibério, intentou resumir a cultura dessa época em agricultura,
leis, filosofia, retórica e medicina. Curiosamente aludiu até aos transplantes
de tecidos!
Reuniu
suas observações em oito volumes sob o título “De Re medica” (“Das Coisas
médicas”). Foi o primeiro autor desta ciência a ser publicado em tipos móveis
(1478), estes genialmente concebidos por Gutemberg, em Mainz, Alemanha, 1440.
Eclodira, assim, uma vera epidemia, divulgada mundialmente, a pandemia do
conhecimento.
Celsius
foi o terceiro ícone (pessoa emblemática, representativa) daquele quinteto de
notáveis, precursores do saber médico, integrantes do “Corpus Hippocraticum”,
alentadíssima antologia produzida no século IV a.C., por escritores de Cós, de
Cnidos, e da Sicilia.
Hipócrates
(“circa” 460-375 a.C.) era ilhéu de Cós, e do que escreveu sobressaíram dois
tópicos: os “Aforismos” (máximas, ou sentenças morais), e o “Juramento”. Aquele
compêndio heterogêneo de quase mil páginas foi escrito em jônico (dialeto do
grego antigo), posteriormente traduzido (e comentado!) pelo francês Émile
Littré (+1881). Deste é também o famoso “Dictionaire de Médicine”, Paris, do
qual temos a 21ª edição, 1.842 páginas, de 1908).
Outro
demiurgo (criador de obra importante) nessa história foi Galeno, nascido em
Pérgano, no ano 130 da nossa era. Galeno integrou a tradição hipocrática
criando uma ortodoxia (doutrina verdadeira) da Idade Média, vigente por mais de
1.500 anos, estribada na Fisiologia e na Patologia, versando da etiologia
(causas) ao tratamento racional (alopatia) das doenças.
A
ele seguiu-se o persa muçulmano Ibn Sina, Avicena, em 1020, com seu formidando
“cânone” (coletânea, catálogo), o “Quanum” (leis, em árabe), o mais importante
livro na Europa e no mundo árabe, suplantando mesmo o trabalho de Galeno.
Verdadeira bíblia médica, tamanha enciclopédia foi estudada até o século XVII
nas universidades cristãs e na Inglaterra. O “Quanum” , de Avicena foi vertido
para o latim como “canone medicinae” , por Gerardo de Cremona, no século XII.
Megarrepositório
de erudição científica, o “Corpus Hippocraticum” foi completado com “De Humanis
Corpora Fabrica”, de Andreas Vesalius em 1543. Em 10 volumes, este monumental
conjunto foi doado à Academia Cearense de Medicina, onde veio integrar a
Biblioteca Dr. Carlos Ribeiro, como Coleção de História da Medicina Dr. Edisio
Tavares, falecido em dezembro último, aos 93 anos.
Tais
inestimáveis obras ali quedarão sob a competente curadoria do
acadêmico/bibliófilo João Evangelista Bezerra Filho. Destarte, com laivos
dourados, encerra-se a gestão do dr. Vladimir Távora, seu operoso presidente.
Parabéns!
(*) Professor
Emérito da UFC. Titular das Academias Cearense de Letras, de Medicina e de
Médicos Escritores.
Fonte: O Povo,
Opinião, de 27/4/2016. p.10.
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