Márcia Alcântara
Holanda (*)
Fidípides foi o
apelido dado ao meu pé, numa alusão aos feitos maratônicos do soldado ateniense
que tinha esse nome e que inaugurou a era das maratonas no mundo. Andarilho
contumaz, carrega consigo um currículo de fazer inveja. Percorreu lugares que
foram da Serra do Espinhaço (MG) ao Mirante da Pedra no Pacoti (CE), da Ibiapaba
(CE) ao Parque Nacional do Caraça (MG), da Serra da Bocaina (RJ) à Chapada
Diamantina (BA), do Castanhão no Alto Santo (CE) à Estrada Real (MG).
Em Toronto fez a
travessia de todo o centro da cidade, repetindo o mesmo em Londres, Paris,
Zurique, Amsterdã, Viena, Hamburgo, Munique, Berlim, Florença e Veneza e muito
mais. Realizando trekkings, caminhando rápido ou lentamente, estava sempre
atento para onde pisasse. Nunca caiu ou sofreu dificuldades que o tirasse do
chão.
Sempre que
retornava de suas andanças, passava a ter um sonho de consumo que ainda hoje
vagueia em sua mente: “Como seria bom caminhar seguro e firme pelas ruas dessa
querida Fortaleza!”. Tentou fazer isso muitas vezes, até que foi ao chão,
estroncando-se da perna, o que o levou a imobilização em cadeira de rodas,
voltando à liberdade do caminhar, seis meses depois.
Verificando os
dados das campanhas levadas ao ar pelos prefeituráveis, observou que Fortaleza está
sob-roda: os carros têm avenidas enlarguecidas, possuem viadutos e túneis que
desembocam nos shoppings, o asfalto contém desenhos de faixas para transitá-las
de bicicletas e ônibus, mas rarissimamente se fez alguma pavimentação de
calçadas padronizadas e seguras para os pedestres. A maioria delas oferece
enormes riscos aos pés, pernas e cabeças dos transeuntes, por serem
derrapantes, esburacadas, estreitas, inexistentes e ocupadas por carros.
Desolado,
Fidípides, como os simples e mortais eleitores dessa Cidade, e que ora se
encontram e se abraçam com os prefeituráveis, nos únicos momentos da vida
desses em que pisam em calçadas e deambulam sobre elas, junto ao povo, a eles,
apela: “Deem alguma chance para os pés dos que não possuem rodas para se
locomoverem, ou mesmo, que preferem usá-los a fim de irem e virem de suas casas
para a escola, trabalho e lazer”. “Se eleitos, compadeçam-se dos seres dessa
Bela Fortaleza! Ofereçam-lhes calçada dignas: sigam a padronização urbana e
será muito bom. Tirem do chão as infames pedras portuguesas, e, se não der,
desenhem, pelo menos, uma faixazinha no asfalto que sirva aos Fidípides da
vida”.
(*) Médica pneumologista; coordenadora do Pulmocenter;
membro da Academia Cearense de Medicina.
Fonte: Publicado In: O Povo, de 29/10/2016. Opinião. p.11.
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