Por João Soares Neto (*)
Nós, sócios vitalícios desse Condomínio, não elegemos bons síndicos
nas assembleias gerais acontecidas desde 2002. Fomos desatentos e não olhávamos
bem o desenrolar dos fatos. Tudo parecia, de princípio, dar certo.
Acostumamo-nos a ouvir pronunciamentos, sempre com duplo sentido,
como se estivéssemos disputando ou ouvindo uma partida ou campeonato de
futebol. O dinheiro era farto, o mundo crescia, as commodities subiam de preço
e a alegria era geral.
Havia sussurros de o Condomínio estar aparelhado, isto é, milhares
de pessoas passaram a ganhar cargos. Além desse fato, comum às gestões
anteriores, surgiram boatos da rápida malversação do dinheiro de todos nós. O
primeiro a levantar a voz foi o Jefferson, não o presidente ianque.
Aí surgiu aquele vídeo de alguém recebendo propina. Merreca. A
trama ia sendo desvendada, pouco a pouco, o Grande Banco e a PTrobras perdeu o
acento e aumentou as obras, faziam parcerias com as big empresas, as fazedoras
de tudo, sempre amigas dos síndicos. De todos. Havia um limite no ousar. Esse
limite foi sendo ultrapassado, dia a dia, mês a mês, ano a ano.
Os grandes empresários do Condomínio passaram a ser amigos,
hospedeiros, conselheiros, ministros e convidados permanentes para as viagens
internacionais do síndico. Ele propalava: aqui não haveria crise. A crise
imobiliária gringa era deles. O nosso condomínio era seguro e o síndico foi até
chamado de “O cara”. Acreditou e não admitiu ser mero afago, uma “joke”.
No rastro do 2008 o Condomínio começou a sentir incômodos, logo
qualificados de marolinhas. Não eram. Viraram ondas, depois mudaram para
pequenas tempestades. Nesse meio tempo, depois de duas assembleias quadrienais,
obrigatoriamente, deveria eleger nova administração.
Optou-se por uma mulher-gerente. Tudo melhoraria, de novo.
Destemida, temível, diligente e sozinha, afora o seu padrinho e os seus
camaradas. As torneiras secavam, os jardins murchavam, a energia subiu, depois
baixou. Uma solução: todos os mega poderiam obter financiamentos subsidiados no
Grande Banco. Os pobres passaram a comprar casas, geladeiras, fogões, camas,
mesas, motocicletas e carros em prestações. Mais dia, menos dia, tudo seria
cobrado. Pagar é outra conversa.
O fato é: a diligente não era tão apropriada, possuía como hábito
dar gritos a torto e a direito, e pedalar. Os condôminos assoalharam haver
muita conversa e pouca realidade, na história contada. Contas foram mexidas a
bel prazer. Técnicos e utopistas foram atrás do rombo. Caixa e Razão.
O ex-síndico passou, exultante o comando. Agora, se autonomeara
embaixador plenipotenciário para um Continente, devidamente acolitado pelo
Grande Banco e os mega empresários, sempre pressurosos em ceder aviões,
mordomias, reparar os danos causados pela escravidão aos irmãos do outro lado
do oceano. Do lado de cá, fez um porto, enquanto fumava cigarrilhas.
O resto, todos não sabem ou não imaginam saber. Esta história ainda
está plena de erros, hiatos, omissões e o longo curso continua. Há outro
síndico no leme do Condomínio. Deus nos ajude.
(*) João Soares Neto é escritor e membro da Academia Cearense de
Letras.
Fonte: Publicado no jornal O Estado-CE.
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