Por José Jackson
Coelho Sampaio (*)
O Brasil não tem política nacional de
ensino superior, embora a expansão acelerada de instituições, cursos e vagas.
No Brasil,
hoje, a universidade pública traz a memória de uma instituição milenar,
história, ritos, defesa da autonomia e zelo pela publicização do conhecimento,
mas, como organização jovem, menos que secular, reage diante da pletora de
demandas acumuladas e da ameaça de estraçalhamento por racionalidades
antagônicas.
Nossa
jovem universidade, parte e expressão de um país com população de 200 milhões e
cobertura ínfima de educação superior, é herdeira de um percurso elitista,
fruto de séculos de colonialismo escravocrata. E sua evolução repete a
ocidental, de modo deslocado e em tempo superacelerado: há que incorporar as
mudanças de um milênio em um século, mesmo quando localmente não são
requeridas, há que desenvolver etapas seguintes, quando as anteriores não foram
cumpridas e há que fazer o de hoje e o de ontem.
Exige-se
das universidades públicas a oferta de Licenciaturas, para formar os
professores da educação básica; a oferta de Bacharelados, para formar as
profissões liberais que não mais se reproduzem no mercado liberal de trabalho;
a oferta de Mestrados e Doutorados, para formar professores universitários e
pesquisadores, carreiras que se realizam no mercado público de trabalho; a
pesquisa científica básica, teórica, universalmente publicizada, que requer
alto investimento a fundo perdido; a pesquisa aplicada, de ajuste e
customização, que é eventualmente apoiada, mas ocorre pelo interesse de
pesquisador empreendedor; a inovação tecnológica é estimulada, contanto que
financiada por meio de renúncia fiscal e para apropriação das patentes; e, como
resultado de ensino, pesquisa e das carências do País, desdobra-se a extensão
social.
O
Brasil não tem política nacional de ensino superior, embora a expansão
acelerada de instituições, cursos e vagas. Confunde-se formação de
profissionais para o mercado de trabalho e produção de conhecimento novo num só
processo. Confundem-se as missões das instituições privadas com as públicas.
Criam-se falsas contradições entre as funções dos níveis hierárquicos, federal
e estadual, mesmo quando a lei estabelece a responsabilidade concomitante. O
poder público cria universidades, sente-se forçado a mantê-las, mas gostaria de
transferir a responsabilidade.
As
crises vividas são extraordinárias: política que não estabelece as bases de um
forte sistema nacional; autonomia decisória truncada sobre o perfil
inarticulado das missões; demandas de médio e longo prazo sustentadas por
financiamento estrutural ínfimo e pontual; estraçalhamento de demandas
emergenciais, sem articulação interministerial e entre níveis de governo;
carreira docente burocrática e bancária em contradição com processo acadêmico
de trabalho; competição de prioridades onde tudo é prioridade; e cultura
corporativa imediatista prevalente em Estado, Mercado e Sociedade.
Sobre
o gestor público acadêmico e seus dispositivos coletivos de gestão paira a
certeza de serem os suportes cotidianos da prática democrática, nos bons tempos
e nos tempos de exceção. A universidade pública deve atuar na solução dos
problemas presentes, mas sua lógica fundamental aponta para o distanciamento
estratégico, gerando competência e consciência críticas.
(*) Professor titular em saúde pública e reitor da Uece.
Publicado. In: O
Povo, Opinião, de 12/11/16. p.11.
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