Por João Soares Neto (*)
“Mude, mas mude devagar, porque a direção é
mais importante do que a velocidade”. Clarice Lispector
Não há segredo: os entes públicos são os maiores anunciantes da
imprensa no Brasil. Alguns jornais, emissoras de rádio e televisão, sites e
blogs, querem posar de isentos e ditadores do bem e do mal. Estão longe disso.
Há extravasamento de paixões, de interesses subliminares, de queixas e
principalmente, da necessidade de vender espaço, tempo publicitário ou projetos
especiais. Como se diz no meio, a imprensa vive do Departamento Comercial. Tudo
é fonte de receita.
Apesar disso, alguns órgãos, quase sempre, convivem com dívidas,
multas e impostos em aberto. Como solucionador dos problemas, sempre aparece
alguém “bem-intencionado” a procurar fórmulas, parcelamentos das dívidas,
deixar prescrever atuações e assemelhados. Dar um jeito, enfim.
Pequeno detalhe: todos os anos, jornais, revistas e cadernos
especiais, após a colheita do Departamento Comercial, realizam certames
premiadores. As festas são opíparas, com cerimoniais longos e enfadonhos. Em poucos
desses casos os premiados até pagam as festas. São os prestadores ou
recebedores de favores, os engendradores de soluções aparentemente legais em
situações complexas. Atraem-se pelo poder, seja ele qual for. Os agraciados até
acreditam nos 15 minutos de fama referido por Andy Warhol.
Ainda há os que se descobrem recentes ‘amigos de infância’, colegas
e parentes dos poderosos, dos adventícios, dos novos ricos, dos usuários de
incentivos fiscais e favorecidos por juros camaradas em bancos oficiais. Dos
que recebem isenções disso e daquilo. Louvam, pela frente, os políticos de
todas as greis e os encastelados em Associações e Instituições de classe a
bradar “ações propositivas”, meras borbulhas. Algumas dessas entidades são
plenas de gente encalhada na vida, mas bem remunerada e a fazer quase nada.
O pacto nacional tão falado não pode excluir uns e privilegiar
outros. Um pacto é exercício de cidadania, não é explicitação de interesses
escusos acobertados por pátina de seriedade. Eu, você, nós todos, somos
coniventes com tal estado de coisas. Vestimos paletós e batemos palmas para uns
e outros. Chega!
Quinhentos e dezesseis anos após a nossa descoberta acidental por
Pedro Álvares Cabral ainda brincamos de fazer e emendar Constituições. A moda
agora é editar PECs – Proposta de Emenda Constitucional. Há PECs para todos os
gostos e afinidades. À Constituição de 1988 já se agregaram cerca de 100 PECs,
algumas casuísticas.
Enquanto formos bisonhos e não tivermos a coragem de denunciar as
patacoadas diuturnas, em todas as esferas do poder e do mundo real, o Brasil
não se manterá sequer entre os países dos BRICs. Infelizmente, nossos tijolos
são feitos de argamassas não consistentes e logo se desfazem. É pena.
(*) João Soares Neto é escritor e membro da Academia Cearense de
Letras.
Fonte: Publicado no jornal O Estado-CE,
11/11/16.
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