Meraldo Zisman (*)
Médico-Psicoterapeuta
… Creio que
cada mulher tem suas peculiaridades, singularidades. Mas a verdade é que, com
ou sem elas, o resultado final da evolução tecnológica, científica, mudou-as, e
com elas, a sociedade ficou, basicamente, irreconhecível, para alguém que tenha
vivido 100 ou 200 anos. Como, então, viver com os mesmos valores, anseios,
desejos, sonhos e fantasias, que se tornam assombração existencial para quem
deseja manter o status quo, que em latim significa literalmente “estado atual”.
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Tenho
observado nesses últimos meses um aumento de um assunto específico no
noticiário nacional e na mídia mundial: um verdadeiro surto epidêmico de
notícias de assedio às mulheres, sem falar nas reportagens e opiniões de
intelectuais e pensadores que mantêm o assunto nas manchetes midiáticas. Devido
a ter sido inicialmente matéria pouco propalada, envolvendo pessoas importantes
no mundo dos negócios, empresários, políticos e, sobretudo do mundo das
estrelas dos grandes shows da vida.
As
mulheres agredidas, revoltadas pelos anos de silêncio que se infligiram (ou lhe
impuseram), ou seja lá pelos mais diversos motivos, mostram-se revoltadas e
denunciam um segredo de polichinelo, a necessidade de ceder ao assédio para
subir na vida e embarcam com grande avidez vingativa contra quem os assediou.
Compreensivo
que estejam revoltadas e que parte delas se tornem extremadas.
É
sobre elas (as extremadas e as menos extremadas) que desejo dar um depoimento
como médico Pediatra por muitos anos e exercendo, atualmente, a Psicoterapia.
Advirto.
Irei
limitar-me à classe média urbana do Recife onde vivo e exerço minha
profissão. Acredito que a violência contra a mulher é assemelhada à
relação escravo/senhor. Socorro-me da dialética Hegeliana [George Hegel
(1770-1831)] e parafraseio esse filósofo alemão: o escravo um dia se liberta e fica
livre, enquanto seu dono jamais se libertará, preso às amarras do sistema escravagista.
Vamos
aos meus casos de ansiedade agora específicos das mulheres. Durante meu
trabalho como Pediatra e Psicoterapeuta tive a oportunidade de observar mães,
mulheres, nas mais diversas situações e agora as mais velhas (muito delas avós)
e mulheres jovens no início da estrada (médicas, advogadas, engenheiras, etc.),
vejo os medos que elas padecem em todas as idades.
… Julgava-se não ser
digna da vida modesta e terminou dando nome ao distúrbio psicológico chamado
bovarismo (Insatisfação romântica que consiste em querer evadir-se de sua
condição, adotando uma personalidade idealizada que pensa ser)…
Não
saberia/poderia afirmar que a maior incidência estatística dos casos de
Ansiedade Generalizada ocorre com mais frequência nas pessoas de sexo feminino.
Vendo, assistindo, aflições e angústias passei a pensar na Madame
Bovary, nome da personagem do escritor francês Gustave Flaubert,
romance publicado em 1857 e batizado com o nome da personagem. O romance
conta a história de uma mulher casada que se envolve com dois amantes, até que,
afogada em dívidas, levando uma vida que não poderia levar, termina por se
suicidar ingerindo arsênico. Julgava-se não ser digna da vida modesta e
terminou dando nome ao distúrbio psicológico chamado bovarismo (Insatisfação
romântica que consiste em querer evadir-se de sua condição, adotando uma
personalidade idealizada que pensa ser).
A
realidade da vida é bem diversa e agora, mais ainda, seja pelo consumismo,
narcisismo, ou a pressa de viver e pensar que as coisas tombam do céu.
A
frustração começa na juventude, mesmo antes do casamento e paro por aqui,
agora. Pretendo voltar ao assunto quando tratar da ansiedade nos jovens, de
ambos os sexos.
Solicito
um resumo de como ficam, ao me deixar, quando as pacientes “se dão alta”, pois
elas vão quando assim desejam. Selecionei um desses resumos que reflete
bem o espectro da Madame Bovary. Vamos ler o que diz:
“…
Ainda persiste o “sonho” das mulheres, de poder realizarem-se na materialização
de um casamento, uma aliança no dedo, o status quo de serem vistas como
“mulheres casadas”, permeando a mente da maioria delas, inclusive as
homoafetivas, sem, necessariamente, serem tão românticas quanto aquela
personagem. No tocante a filhos, é que bate a ansiedade! Tê-los ou não os ter?
Eis a questão!”
Pergunto-me,
seria para se provarem férteis às outras mulheres, e unicamente por esse
motivo, causar-lhes certa “invejinha”? Um rebento, talvez dois e, pronto.
Chega, está de bom tamanho essa prole! Continuam inebriadas com a possibilidade
de afirmarem-se como “mulheres parideiras” diante de seus/suas companheiros/as,
com a fertilização/gestação.
No
tocante à criação/educação dessa cria… é que, realmente, a porca torce o rabo!
Não abdicam mais de seu lado de profissionais liberais, da independência financeira
em qualquer área. Porém, não agir, lhes dá culpa, vivem mal e, projetam certa
ansiedade na frustração de nunca exercerem a maternidade, nem ao menos uma, ou
será que nem todas as mulheres nasceram para ser mães, unicamente?
Creio
que cada mulher tem suas peculiaridades, singularidades. Mas a verdade é que,
com ou sem elas, o resultado final da evolução tecnológica, científica,
mudou-as, e com elas, a sociedade ficou, basicamente, irreconhecível, para
alguém que tenha vivido 100 ou 200 anos. Como, então, viver com os mesmos
valores, anseios, desejos, sonhos e fantasias, que se tornam assombração
existencial para quem deseja manter o status quo, que em latim
significa literalmente “estado atual”.
Devemos
aproveitar o momento para recompor a intimidade das pessoas, não importa o sexo
ou o gênero. Escrevi este artigo após ler numa revista de circulação
nacional “nas questões de gênero” uma alínea intitulada:
O Dia que Aprendi a Lutar Caratê, que prega a
instauração de aulas de defesa pessoal feminina no currículo da pré-escola.
Nada contra as artes militares. Mas tenho certeza de que o caminho não é por
aí.
Concluo
dizendo, cuidado, muito cuidado: foram as revelações do espectro de Hamlet que
desencadearam a ação da tragédia.
(*) Professor Titular da Pediatria
da Universidade de Pernambuco. Psicoterapeuta. Membro da Sobrames/PE, da União
Brasileira de Escritores (UBE) e da Academia Brasileira de Escritores Médicos
(ABRAMES). Consultante
Honorário da Universidade de Oxford (Grã-Bretanha).
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