As forças armadas, desde tempos recuados, que remontam à Antiguidade, primam pela obediência a uma rígida hierarquia, na qual os superiores mandam em seus inferiores, de conformidade com os postos e graduações de cada militar. Assim, nas graduações do exército, o sargento manda no cabo que manda no soldado; no oficialato, as promoções vão de tenente a general (ou marechal, sob certas circunstâncias), em uma sequência de patentes em que as posições mais elevadas sujeitam as que lhes são subalternas.
As esposas dos militares costumam levar uma vida de renúncias e
sacrifícios que, amiúde, tolhem o exercício de atividades profissionais, em
função da necessidade de acompanhar seus cônjuges nas sucessivas transferências
a que eles estão submetidos.
As esposas de oficiais são muito solidárias, umas com as outras,
principalmente quando são em pequeno número, em pequenas cidades ou em postos
avançados de fronteiras. Contudo, quando seus companheiros estão servindo em
grandes cidades, que contam com uma maior concentração de oficiais, as rodas de
amizades, nas reuniões ou nos encontros informais, de praxe, são constituídas
observando-se o posto do marido; desse modo, as mulheres de tenentes
compartilham a mesma mesa e idem para as senhoras de capitães e de majores.
Dizem que existe até a troca de rodas, quando ocorre a promoção e o seu amado
ainda não foi transferido.
Essa prática, aqui convencionada pelo rótulo de hierarquia
talâmica, em que as esposas se subordinam à posição de seus maridos, está
afeita à condição conjugal, e, portanto, ao leito nupcial ou ao tálamo.
Uma prova concreta e inconteste do efeito talâmico foi vivenciada,
no início da década de 1980, pelos participantes da comissão de avaliação das
candidatas a um curso de especialização em Enfermagem do Trabalho, promovido
por uma universidade cearense.
A seleção era conduzida com base nos curricula vitarum das
inscritas. Uma concorrente surpreendeu os membros da comissão citada por listar
uma série de títulos vinculados à caserna, o que, a princípio, se levaria a
pensar que se tratava de uma enfermeira do exército.
Quando a comissão foi conferir os documentos comprobatórios,
deparou-se com algo deveras estranho: as certificações, de cursos, estágios e
treinamentos, estavam atreladas à vida militar de seu príncipe consorte, o que
incluía até certificados norte-americanos, indicativos do treinamento que ele
fizera
Marcelo Gurgel Carlos da Silva
Ex-Presidente da Sobrames-Ceará
* Publicado In: SILVA, M. G. C. da (Org.). Ordinário, marche! Médicos
contam causos da caserna. Fortaleza: Expressão, 2015. 112p. p.81-83.
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