Pra revigorar, revi Goré!
Pedreiro
e poliglota, disgotador de fossa e rezador. Alma generosíssima - rara.
Desfrutar da companhia de Zé de Goré é aprender o que livro nenhum ensina. Em
uma hora de conversa, eivada de metáforas, aprende-se mais que todo o conteúdo
do primeiro ano forte. O que ele ensina, pratica; e o faz com altruísmo. Em
conversa sobre a pandemia, perguntei-me: por que Goré não está na Fiocruz?
Disse-me
que a menina dele, atestada positivo para a Covid-19, passou dias muito
"raquética" - parecia uma raquete de tão raquítica. Tratamento e
cura, permitam-me compartilhar. Começou dando-lhe caldo morno de preá do mato
pra pegar uns quilinhos nas primeiras 48 horas. Como complemento, um engrolado
à base de aveia com rapadura de coco, paçoca com raspa de juá, feijão com
toicim de bacurim e ensopado de mocotó.
Quando o caso
é fome...
E
como o cabelo grande é foco do vírus, de acordo com Zé, "cortei-lhe a juba
estilo prinspe de galo". Onde? "Na barbearia mamãe" (em casa
mesmo). "E nos pusemos a 'diagolar' sobre coisas boas, dentro da coisa nem
tanto". Ponto primordial, conforme ele: o cristão, em tempo algum, poderá
cortar prego (amedrontar-se) enquanto adoecido. "É pensamento positivo e
pose de quem 'veve' positivamente".
O
fato é que a menina de Zé de Goré tá só o pó da macaúba hoje em dia. Mas, vamos
aos detalhes dos procedimentos bem-sucedidos, para que sirvam de exemplo. A
filha ficou proibida de andar de "oitonove" (automóvel) nos primeiros
dez dias da doença, tendo por único "heróis" (herói) o Padim Ciço.
Necessário foi "arranhar uma coisinha de inglês e traçar um francesim de
leve, para pra não levar 'de arruda' da bula". E jamais ficar
"dispirocada do juízo" (amedrontada) porque contraiu a macacoa. Mais:
- Não se preocupar com o santo, se importar apenas com o milagre da
cura. E esperar sabiamente, como gavião no ôi do toco...
"Melhor
que isso, só dois isso!"
Com
a palavra, ele mesmo, Zé de Goré: "Infeliz das costa oca quem disser que a
mazela que abate o mundo é coisa buga (fácil) de peitar. Água muita e sol
demais é medida grau dez. Acresça fé na peleja como quem bota hipoclorito 'na
tomate' quando a verdura chega do mercantil. A propósito, aproveite e lave tudo
em bacia comprada a galego, cantando bendito do Padre Zezinho.
Não
queiram ter querer se por um 'acauso' essa pustema pegar-lhes de proa. Encham o
bucho com dicumê de sustança. Essa gororoba de farmácia que tão dizendo aí,
chamada num sei quê, num seu quê mais, passa nem perto, bate nem o centro! O
torado da cura tem um nome: 'dirrubar' três cai duro na merenda, se alimentando
como quem dá carga em jumento. Nunca passe por baixo da mesa (nunca deixe de
comer o almoço ou a janta).
Brebotar
(comer besteira, burundanga; botar pra dentro um 'brebôte'), nem pensar! A
comida do cristão tem que fazer volume nas tripas. É comer e comer até o caneco
fazer bico! Na base do 'eu quero é que o mar pegue fogo pra eu comer peixe
assado!' Foi assim que fiz com minha menina. E aí você me pergunta: levaste ela
ao médico? Eu respondo: levei. E aí tu repergunta: o que ele disse?
- Que o caso da minha fia era fome...
Fonte: O POVO, de 24/08/2020.
Coluna “Crônicas”, de Tarcísio Matos.
p.2.
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