Camões? Bate nem
o centro! Nem incha
Eram
os anos 1970, do milagre na economia, do Mobral pra ler e escrever, da
Transamazônica selva adentro, da dupla cearense soltando a voz em “Eu te amo
meu Brasil, eu te amo...” Exatamente nela inspirada, a “parêa” João e Pedro não
alcançou a fama de Don e Ravel naquele tempo, mas teve experiência única no
fértil campo literário, quando estudantes de conceituado colégio de Fortaleza.
Tudo
começou quando o professor de Português deles anunciou um festival de poesias
dentro em breve; para incentivar a participação da moçada nas letras, acertou
que ao aluno interessado em expor a veia poética estaria assegurado um ponto
extra para fechar a média. “Na hora!” – disseram ambos, certos da conquista.
João
e Pedro não eram poetas, mas tinham um primo engajado em movimentos culturais e
intelectuais da cidade, “verdadeiro Castro Alves depois da gripe”. Foram ao Zé
Walter, “onde o dito cujo se escondia”, convencê-lo de uma “produçãozinha
emprestada”, para fins emergenciais, desde que a autoria fosse repassada à
dupla.
-
Primo, se tem compositor que vende músicas, que mal há em você atender ao
pedido de uma dupla que apenas somar um pontinho na média? – ponderou Pedro.
-
Ok, vocês venceram. Vou fazer. Esperem! – anuiu o poeta da família.
Do
Zé Walter, poesia no bolso, João e Pedro retornam a casa, certos de ganharem o
tal ponto extra. De resto era inscrever suas produções. Dias depois, a boa
notícia - ao menos para o “jovem poeta Pedro”: seu poema fora classificado. E o
ponto ganho, conforme prometido pelo mestre. Ocorre que o autor tinha de
participar da grande final do festival, defendendo a criação para o Colégio
inteiro assistir.
Dia
da apresentação, auditório lotado, júri postado. Pedro é chamado a cumprir a
derradeira etapa do certame. Sob efeito de duas lapadas de Dandiz, sobe ao
palco e declama, de sua autoria, isso:
-
Lá vem, a lua surgindo / Redonda como uma vara / Se for minguante, eu pulo!...
Quando Sérgio é
Raimundo e Ricardo é Bartolomeu
Interessante
essa história do nome da gente. Há pessoas inadequadas para certos nomes
próprios. Tenho um neto de três anos, por exemplo, chamado Rodrigo, em quem
jamais caberia um Conegundes, Juvenal, Procópio, Licurgo, Gusmão. Por isso,
acredito, há pessoas de que nunca acertaremos chamar pelo que tá no batistério.
Gente com cara de Roberto que, registrado Dionísio, jamais assim será chamado.
-
Roberto, que horas poderão serão? – perguntei.
-
Nove e quinze! Mas me chamo Dionísio Casimiro – retrucou ele.
-
Aí foi que lascou! Por cima ainda é Casimiro! Tá certo, Roberto!
Todo
esse bodejado é para contar o que sucedeu com o Sérgio, que seu compadre
Ricardo só chamava de Raimundo – e Sérgio só chamava Ricardo de Bartolomeu.
Compadres há 25 anos, em tempo algum se dedicaram a saberem o que consta de
seus registros de nascimento. Razão por que quase se intrigaram. Sérgio deu
festa grande em bufê famoso do Conjunto Ceará para comemorar 20 anos de casado.
O nome de Bartolomeu estaria na portaria, era só chegar e se identificar. E lá
ele está com a família.
-
Seu RG, senhor, por gentileza! – pediu gentil o porteiro.
-
Tome! – entregou Bartolomeu o documento.
-
Ricardo, Ricardo, Ricardo... Tem esse nome aqui, não! – disparou o moço da
portaria, após conferir nome por nome.
-
Beisso, macho?!? Sou cumpade do figurão desse balacobaco! Chame Raimundo aqui!
-
Raimundo?!? Nããã!!!
Fonte: O POVO, de 23/7/2021. Coluna “Crônicas”, de Tarcísio Matos. p.2.
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