segunda-feira, 4 de outubro de 2021

PARADOXO: Jardim Eurângela

Por Luiz Gonzaga Fonseca Mota (*)

Jardim Europa e Jardim Ângela são dois bairros de São Paulo, a principal cidade brasileira e uma das maiores do mundo. Apesar de relativamente próximos do ponto de vista geográfico, há uma distância incalculável no que diz respeito aos aspectos social e econômico, entre os mencionados bairros. Tempos atrás, li na mesma edição de um jornal paulista, aliás paulistano, dois fatos marcantes ocorridos nas áreas citadas. No Jardim Europa, local onde se concentram pessoas muito ricas – elevada renda “per capita”, carros importados, condomínios ou casas com piscinas, mulheres belas, homens elegantes fumando charutos cubanos, proprietários de bancos, fábricas e haras – aconteceu um grande jantar, à luz de velas, em homenagem a uma figura conhecida nos meios empresarial, político e, claro, na alta sociedade. Já no Jardim Ângela, bairro também paulistano onde estão pessoas muito pobres – miséria, falta de oportunidades, fome, desemprego, violência, casebres, crianças abandonadas – aconteceu o velório de um menino que faleceu por ser subnutrido, ou seja, morreu de fome. O caixão do anjinho de apenas dois anos era de lascas de madeira, coberto de papel, feito por seu pai. O fato me chamou a atenção pelo acentuado nível de desigualdade e por serem o homenageado dos ricos e a criancinha do velório ambos oriundos do Nordeste. Não tenho a estatística, mas não estaria longe da verdade ao dizer que a grande maioria dos nordestinos que buscam São Paulo ou outros centros não consegue o sucesso esperado. Mostrei este contraste para ressaltar que o Nordeste é o principal problema social do Brasil. Os migrantes buscam melhores condições de vida, no entanto, deparam-se, quando surgem oportunidades, com um mercado de trabalho cruel, caracterizado pela exploração da mão de obra em atividades mal remuneradas, sazonais e sem perspectivas. Recursos devem ser destinados e políticas públicas adotadas visando o estímulo às atividades produtivas e à geração de emprego e renda. Chega de prioridade retórica. Sim à inclusão social. P.S. “As superfluidades dos ricos são as necessidades dos pobres. Quem possui o supérfluo, possui bens alheios” (Santo Agostinho).

(*) Economista. Professor aposentado da UFC. Ex-governador do Ceará.

Fonte: Diário do Nordeste, Ideias. 24/9/2021.

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