terça-feira, 7 de dezembro de 2021

ESTRELAS MUDAM DE LUGAR

Por Sofia Lerche Vieira (*)

A prematura partida de Marília Mendonça despertou sentimento de dor coletiva que não se explica pela razão.

Em quaisquer circunstâncias, a morte é sempre um mistério. Quando precoce, muito mais. Se é de um ícone, em qualquer área de atuação, desperta um sentimento de dor coletiva nem sempre explicável pelos argumentos da razão.

A prematura partida de Marília Mendonça foi assim. Não apenas seus fãs em lágrimas lamentaram a perda, como todos os brasileiros. Uma jovem mãe. Uma compositora e cantora talentosa que quebrou paradigmas. Uma unanimidade nacional. Ícones em outras áreas, ao partirem, deixaram atrás de si um rastro de tristeza. Ayrton Senna (1994) e Eduardo Campos (2014), exponentes no esporte e na política, podem ser lembrados por motivos semelhantes.

Ayrton, nosso Rei da Chuva, que comovia o país ao desfilar sua vitória agasalhado pela bandeira nacional nas corridas de Fórmula 1. Seu cortejo fúnebre levou multidões às ruas de São Paulo. Daquele dia, ficaram arquivados na memória os dizeres de uma faixa: “Ayrton, sem você as tarrafes de domingo nunca mais serão as mesmas”. De fato; não foram.

O que dizer de Eduardo Campos, ex-senador e governador, morto em plena campanha para a presidência da república? Também sua precoce morte despertou comoção em todos. A tradução de uma esperança se contentou em ser sonho. Daqueles dias de assombro, entre tantos artigos e falas de admiração, permaneceu a imagem de uma charge publicada na Folha de São Paulo. Eduardo pilotava um aviãozinho rumo ao céu. O título revisitava uma canção de Roberto Carlos, imprimindo-lhe novas cores: “estrelas mudam de lugar”.

Situações como essas fazem lembrar que a vida está sempre por um fio; que a transitoriedade é um componente essencial de nossa humanidade; e, que o efêmero é uma característica do ato de existir. Em um instante tudo pode se esvanecer, restando o espanto perante a dor do que se foi.

Nossas estrelas foram brilhar em outras paragens. Não temos respostas para o enigma de suas vidas interrompidas. Resta, talvez, o consolo das palavras do poema “Ausência”, de Carlos Drummond de Andrade: “as coisas findas, muito mais que lindas, estas ficarão”. Será?

(*) Professora do Programa de Pós-Graduação em Educação da Uece e consultora da FGV-RJ.

Fonte: Publicado In: O Povo, de 8/11/21. Opinião, p.22.

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