Meraldo
Zisman (*)
Médico-Psicoterapeuta
… Muitas patologias não passam de
concessões feitas ao poder médico tradicional, que age como mero robô, tanto
nas pandemias como fora delas. Cada ser humano tem uma maneira única de
adoecer…
É evidente que a doença pandêmica causada
pelo vírus apelidado de COVID-19 está aumentando a ansiedade global, assim como
o medo da ameaça – real ou sugerida – à saúde física/mental de cada um.
Ademais, com uma taxa de mortalidade média entre 3% e 5%, a gravidade da
doença, o resultado do tratamento e o prognóstico variam profundamente entre os
indivíduos, independente das regiões. Depois de tantos anos de prática médica
eu sei que cada pessoa adoece de uma maneira. A patogênese do COVID-19 pode
parecer nova, mas compartilha algumas semelhanças com as epidemias virais
anteriores que assolam a humanidade desde a Pré-história. Apesar disso, não se
pode esquecer que, com o advento de descobertas técnico-científicas, a Medicina
de hoje está bem mais preparada para enfrentar as viroses.
Mesmo que a preparação de vacinas para o
combate ao COVID-19 esteja em plena atividade, algumas medidas como isolamento,
higiene pessoal e outras preventivas são necessárias. As vacinas específicas
estão em preparação e certamente dentro em breve disporemos delas. Enquanto
isso, pouco se fala, comenta ou adverte sobre a situação da Psicoimunologia,
designada como a área de estudo e investigação direcionada para a compreensão
da influência de variáveis psicológicas no funcionamento e efetividade
imunitários. Lembro que ela constitui parte integrante da Psicologia da Saúde
na ‘interface’ entre a saúde física e psicológica e, deste modo, deve ser
considerada no todo que é a Pessoa.
Propaga-se, e é fato, que os adultos mais
velhos com multimorbidades podem ser particularmente afetados por questões como
isolamento, solidão, assistência ao fim da vida e luto, que podem ser
exacerbadas pela chamada “divisão digital”. Em época em que a informática e os
algoritmos despontam com orientação para a vida esquece-se de que tal
bifurcação provoca uma nova discriminação tecnológica que é sim, outro aspecto
da pobreza e exclusão social.
Por isso novos fundos, estratégias, e
avanços serão necessários para procurar minorar as desigualdades, alavancando a
infraestrutura das lideranças mundiais em pesquisa sobre neurociência e saúde
mental, para amparar uma resposta global aos problemas de saúde mental e
neurológicos da pós-pandemia.
Nestes tempos difíceis, a ciência da saúde
mental deve ser aproveitada para servir à Sociedade e beneficiar a saúde global
de cada indivíduo, a longo prazo. Caso desejarmos continuar no mito da
separação soma/psíquico (doenças psicossomáticas) implicaremos na admissão de
que existem outras nosologias que não são psicossomáticas. Enquanto nós, os
médicos e demais profissionais de saúde, assim pensarmos, estaremos definindo à
necessidade de um paciente “somatizar” a sua doença ou desenvolver um distúrbio
psicológico qualquer.
Advirto e aconselho cautela. Muitas
patologias não passam de concessões feitas ao poder médico tradicional, que age
como mero robô, tanto nas pandemias como fora delas.
Cada ser humano tem uma maneira única de
adoecer.
(*) Professor Titular da Pediatria da Universidade de Pernambuco. Psicoterapeuta. Membro da Sobrames/PE, da União Brasileira de Escritores (UBE), da Academia Brasileira de Escritores Médicos (ABRAMES) e da Academia Recifense de Letras. Consultante Honorário da Universidade de Oxford (Grã-Bretanha).
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