Por Carlos Roberto Martins
Rodrigues Sobrinho (Doutor Cabeto) (*)
Há tempo
insistem, os amigos, para que eu escreva sobre a pandemia da Covid 19.
Afinal, avaliam que conheci a realidade bem de perto, sob vários ângulos, quais
sejam como paciente ao ser internado, como médico nas UTIs e nas emergências,
além de exercer naquele momento, o cargo de secretário de Saúde do nosso
Estado.
No entanto,
rejeitei a ideia, talvez devido à minha autocrítica, e também, por não me achar
com direito de fazer qualquer julgamento, sem que o tempo acontecesse. Pois, somente
assim, somos capazes de prover uma análise mais isenta.
Mas, se o
fizesse, iniciaria pelo fim, pela aflição dos inúmeros sequelados, pelas famílias abandonadas, pelas consequências
de um comportamento doentio de uma sociedade que rejeita qualquer
questionamento, que não demonstra sensibilidade, que se faz no absoluto, no
irredutível. Soa como se a dúvida expusesse nossas fraquezas, o que há de medo
e insegurança.
Iniciaria pela
constatação que apagamos as mortes e
os mortos, insistimos em
negar as nossas realidades, agora ainda mais evidentes e que foram
descortinadas com a pandemia. O sistema de saúde que não funciona e que não
transige, que não concilia, não valoriza o trabalho e não acata as necessidades
dos pacientes, o gasto público ineficiente (provavelmente é a causa de muitas
das nossas mazelas), as cidades que marginalizam a maioria da população, uma
sociedade cega mas com "faca amolada ", um sistema de governo que não
elabora, não faz mea culpa, quando não representa os interesses da maioria.
Por outro lado,
vivi, em meio àquela tragédia humana, uma esperança. Era uma convicção, quase
uma certeza, que depois de tudo assistiríamos a uma mudança nas pessoas, quando seriam mais voltadas para o essencial e para a
solidariedade, que construiríamos pontes para aproximarmos os políticos e o
povo, e enfim, seríamos mais altruístas e dispostos a mudar.
Mas,
infelizmente, nada aconteceu! As cidades pioraram, os miseráveis aumentaram e a desconfiança, essa sim, tornou-se absoluta.
Assim, após
três anos do início da pandemia, vem a certeza que ainda não é o momento para
assistir esse novo mundo. E entender que as mudanças precisam de
tempo, de maturidade, até que um dia acontecem.
E que vão sim
se apresentar, o mundo e a realidade, com capacidade de análise crítica consequente, percebendo quando precisa mudar, mudar para mudar,
mudar porque entende o quanto precisa, mudar sucessivamente para não parecer
único e absoluto.
Vamos em frente...
(*) Médico. Professor da UFC.
Ex-Secretário Estadual de Saúde do Ceará.
Fonte: Publicado In: O Povo, de 25/03/2023. Opinião. p.19.
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