Por Sofia Lerche Vieira (*)
Mal começou a ser posta em prática, a reforma do ensino médio já
está fazendo água. O próprio presidente Lula afirma que o "MEC vai mudar a
reforma do ensino médio" (UOL, 22 mar. 2023). Vozes em sua defesa existem,
mas vão sendo emudecidas pelo estardalhaço das críticas. Estas se multiplicam
na mídia, nas redes sociais e invadem ruas e praças das grandes cidades
brasileiras. A reforma caiu na boca do povo. E todos parecem insatisfeitos com
o estado das coisas.
Aprovada por lei em 2017 e com previsão de implementação até 2022,
a reforma atravessou a pandemia, sofrendo efeitos deste percurso inesperado e
padecendo também devido a outros problemas.
Como a maioria das inovações pedagógicas, requer tempos e espaços
apropriados, tendo esbarrado em uma infraestrutura escolar despreparada para
promover mudanças de grande porte. Prevista para ocorrer sob um cenário de
grande crescimento da oferta de tempo integral, encontrou um obstáculo
significativo na baixa capacidade de expansão dos sistemas estaduais de ensino.
Buscando promover a atratividade da escola junto aos jovens,
inspirou-se em "itinerários formativos" que assegurariam combinações
diversas de conteúdo e formação, substituindo grades curriculares engessadas.
Ao que tudo indica, porém, a autonomia para novas escolhas foi levada a
extremos, gerando insatisfação e perplexidade. Em matéria recente sobre o tema,
o jornal Folha de São Paulo (17 mar. 2023) registra 1.526 disciplinas ofertadas
no novo ensino médio em escolas estaduais. Estudantes reclamam de temas sem
conexão com suas aspirações de aprendizagem. Professores, por sua vez, revelam
não ter sido ouvidos.
É verdade que é preciso avançar e decidir, mas no momento, tudo se
mistura e parece prevalecer um diálogo de surdos. Em um contexto onde se
reivindica o entendimento, contraditoriamente, a escuta e a reflexão começam a
ceder espaço à intolerância. E o ensino médio, mais uma vez, padece com a
indiferença de formuladores e implementadores de políticas. Sabe-se da
necessidade de um novo ensino médio, mas cabe a pergunta: por quanto tempo se
há de esperar?
(*) Professora do Programa de Pós-Graduação em Educação da Uece e
consultora da FGV-RJ.
Fonte: Publicado In: O Povo, de 27/03/23. Opinião, p.20.
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