Por Sofia Lerche Vieira (*)
A notícia amplamente circulada na mídia de que em 2024 o governo do
estado de São Paulo iria abolir os livros didáticos do Programa Nacional do
Livro Didático (PNLD) a partir das turmas de 6ª série do ensino
fundamental gerou polêmica nacional e fez a gestão retroceder. Mesmo
estando em curso medidas de substituição de livros impressos por materiais
digitais já no ano de 2023, o próprio governador veio a público esclarecer
tratar-se de um ruído de comunicação. Ruído ou não, o imbróglio suscita a
reflexão.
É oportuno lembrar que iniciativa de tal natureza tem implicações
diversas. Uma delas diz respeito ao próprio direito à educação. Segundo a
Constituição Federal de 1988, a educação é um direito social (Art. 6º) e a
"igualdade de condições para o acesso e permanência na escola" um
princípio orientador do ensino (Art. 206, I). Bem sabemos que equipamentos e
conteúdos digitais não são igualmente distribuídos entre a população e as
escolas.
Os segmentos mais vulneráveis, neste caso, são os mais atingidos
pela falta de acesso às tecnologias que propiciam o acesso a informações
veiculadas em dispositivos móveis como notebooks, tablets e telefones
celulares. Crianças e jovens pobres, assim como escolas situadas em territórios
periféricos, por certo, não têm acesso às mesmas condições de aprendizagem que
aquelas residentes em regiões mais privilegiadas.
Outro aspecto a considerar diz respeito à dimensão pedagógica de
uma política voltada para o uso exclusivo de materiais didáticos digitais. O
texto impresso é elemento insubstituível do processo de alfabetização. Sua
relevância prossegue em anos mais avançados da escolarização e ganha corpo na
proporção do avanço da educação formal.
Não há dúvida de que conteúdos digitais auxiliam o processo de
ensino-aprendizagem e são elementos complementares significativos
do enriquecimento curricular. Mas isso não significa dizer que possam ou
devam substituir os conteúdos impressos. A aventura do conhecimento passa pelos
livros. E esse prazer deve ser cultivado na escola.
(*) Professora do Programa de Pós-Graduação em Educação da Uece e
consultora da FGV-RJ.
Fonte: Publicado In: O Povo, de 14/08/23. Opinião, p.20.
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