terça-feira, 19 de setembro de 2023

IMPRESSO OU DIGITAL?

Por Sofia Lerche Vieira (*)

A notícia amplamente circulada na mídia de que em 2024 o governo do estado de São Paulo iria abolir os livros didáticos do Programa Nacional do Livro Didático (PNLD) a partir das turmas de 6ª série do ensino fundamental gerou polêmica nacional e fez a gestão retroceder. Mesmo estando em curso medidas de substituição de livros impressos por materiais digitais já no ano de 2023, o próprio governador veio a público esclarecer tratar-se de um ruído de comunicação. Ruído ou não, o imbróglio suscita a reflexão.

É oportuno lembrar que iniciativa de tal natureza tem implicações diversas. Uma delas diz respeito ao próprio direito à educação. Segundo a Constituição Federal de 1988, a educação é um direito social (Art. 6º) e a "igualdade de condições para o acesso e permanência na escola" um princípio orientador do ensino (Art. 206, I). Bem sabemos que equipamentos e conteúdos digitais não são igualmente distribuídos entre a população e as escolas.

Os segmentos mais vulneráveis, neste caso, são os mais atingidos pela falta de acesso às tecnologias que propiciam o acesso a informações veiculadas em dispositivos móveis como notebooks, tablets e telefones celulares. Crianças e jovens pobres, assim como escolas situadas em territórios periféricos, por certo, não têm acesso às mesmas condições de aprendizagem que aquelas residentes em regiões mais privilegiadas.

Outro aspecto a considerar diz respeito à dimensão pedagógica de uma política voltada para o uso exclusivo de materiais didáticos digitais. O texto impresso é elemento insubstituível do processo de alfabetização. Sua relevância prossegue em anos mais avançados da escolarização e ganha corpo na proporção do avanço da educação formal.

Não há dúvida de que conteúdos digitais auxiliam o processo de ensino-aprendizagem e são elementos complementares significativos do enriquecimento curricular. Mas isso não significa dizer que possam ou devam substituir os conteúdos impressos. A aventura do conhecimento passa pelos livros. E esse prazer deve ser cultivado na escola. 

(*) Professora do Programa de Pós-Graduação em Educação da Uece e consultora da FGV-RJ.

Fonte: Publicado In: O Povo, de 14/08/23. Opinião, p.20.

Nenhum comentário:

 

Free Blog Counter
Poker Blog