Por José Nelson Bessa Maia (*)
Os indicadores
econômicos da China mais recentes apontam persistentes desafios no
processo de recuperação pós-pandemia de Covid-19, uma vez que os dados de
comércio exterior e de formação bruta de capital fixo indicam tendência
conjuntural declinante. Alguns analistas mais apressados arriscam-se a afirmar
que a economia chinesa estaria ingressando numa fase de estagnação. No entanto,
sabe-se que as autoridades chinesas estão sempre atentas aos movimentos nos
mercados e na economia global e propensas a adotar medidas necessárias
que corrijam rumos e alterem a situação por meio de ajustes no arsenal da
política econômica e da melhoria no clima geral de negócios.
Com efeito, o
conjunto de indicadores de julho de 2023 sugere que a recuperação econômica
continua a avançar no sentido desejável de um padrão de alta qualidade, mesmo
em face das dificuldades derivadas do demorado ajuste no setor imobiliário
chinês, fatores geopolíticos adversos, protecionismo comercial, insuficiência
na demanda interna e a necessidade de reforçar os pilares em transição para a
retomada do crescimento sustentado.
Muitos
comentaristas de bancos de investimento deixam-se levar por uma onda de
pessimismo tocada pela leitura equivocada e parcial de alguns poucos
indicadores de conjuntura que oscilam para cima e para baixo. Esquecem-se de
que a China tem um modelo de economia mais resiliente do que outras
nações e que seus gestores de política dispõem de meios fiscais, monetários e
regulatórios para reverter movimentos que noutros contextos poderiam abalar a
estrutura econômica.
Com efeito, uma
série de medidas foi tomada para reativar a economia chinesa. Um plano de 31
pontos foi anunciado pelo governo para remover barreiras à entrada e
fortalecer os direitos de propriedade intelectual. Outro plano de 20
providências voltadas para expansão do consumo foi posto em prática para
incentivar as atividades de lazer e o turismo, assim como 26 outras medidas
foram adotadas para dar mais mobilidade ao fluxo de mão de obra rural para as
cidades.
Ações também
foram tomadas para facilitar a entrada de capital estrangeiro (o “Invest in
China 2023”). Além disso, o banco central do país (PBOC) baixou a taxa
básica de juros – uma medida concebida para ajudar a revigorar a atividade
econômica. Esse conjunto de ações e outras que vierem a ser tomadas atuam no
sentido de reforçar a demanda e o consumo das famílias e reanimar a confiança
do setor privado chinês.
Apesar dos
fatores adversos acima citados, a China ainda registou um crescimento razoável
em todos os setores em julho de 2023, mas também foi observada uma desaceleração
no crescimento em outros principais indicadores econômicos. Embora os
serviços e o consumo tenham continuado a registrar um crescimento considerável,
a expansão da produção industrial abrandou ligeiramente a partir de junho e as
exportações e os fluxos de investimento direto estrangeiro (IDE) também se
reduziram. Entretanto, o investimento em ativos fixos foi direcionado
para setores como aqueles de pesquisa & desenvolvimento (P&D) e de alta
tecnologia, cujos impactos positivos não tardarão a serem sentidos.
As empresas
chinesas de serviços tiveram um forte desempenho no terceiro trimestre deste
ano, de acordo com os dados da pesquisa Índice de gerentes de compras (PMI). O
índice de serviços da China voltou a subir em julho de 2023, para 54,1, após
ter mostrado queda em junho (53,9), segundo pesquisa da S&P Global com o
Caixin Insight Group. A leitura final veio acima das previsões. As leituras
acima do nível de 50 indicam que a atividade econômica da China está em território
de expansão. A atividade empresarial em todo o setor cresceu fortemente e a
recuperação foi apoiada por um aumento acentuado em novos negócios, o que
encorajou as empresas a expandir sua folha de pagamento pelo sexto mês
consecutivo.
O desempenho do
setor de serviços (terciário) é crucial para a economia e o emprego na
China. É responsável por 55% do PIB e 48% do emprego. Ele inclui vários
segmentos de prestação de serviços como o transporte de pessoas e cargas,
telecomunicações, serviços financeiros, cuidados de saúde, comércio, bem como
entretenimento e recreação. O setor foi duramente afetado pelas medidas da
política de Covid Zero do país em 2022, especialmente em segmentos como o
turismo, restaurantes e o varejo. No entanto, os resultados de PMI oficiais
sugerem que a recuperação a partir da reabertura econômica na China retomou o
fôlego em julho após dois meses de retração.
O fraco cenário
global pesou sobre a indústria manufatureira devido à queda nas exportações,
mas os serviços continuaram a se beneficiar da retomada dos gastos dos
consumidores. No entanto, mesmo com os bons resultados de julho, as empresas de
serviços demonstraram menos otimismo ao avaliar as perspectivas de 12 meses
para a atividade comercial, com o nível de confiança geral recuando para
níveis de 2022. Com relação aos preços, as empresas sinalizaram aumentos mais
suaves na evolução de custo dos insumos.
É nesse contexto
de retomada do dinamismo no setor de serviços que a China vai realizar em
Beijing, de 2 a 6 de setembro de 2023, mais uma edição da Feira Internacional
de Serviços Comerciais da China (CIFTIS), a maior exposição em termos do
comércio global de serviços e a exposição líder na área do comércio de serviços
na China. Com o tema "a abertura traz o desenvolvimento, a cooperação cria
um futuro ganha-ganha", prevê-se que a CIFTIS 2023 contará com 202
eventos variados, incluindo fóruns, negociações e cúpulas. Ao todo, 51 países e
24 organizações internacionais já confirmaram participação. A feira abrangerá
uma ampla gama de tópicos, como telecomunicações, serviços de informação,
serviços financeiros, serviços de saúde e saneamento e serviços ambientais.
Mais de 70
companhias e instituições reconhecidas mostrarão suas realizações e mais de
2.200 empresas participarão de suas exposições, entre as quais empresas globais
da Revista Fortune 500 e empresas líderes do setor. Os expositores
exibirão os mais recentes avanços em economia digital, serviços culturais,
serviços de turismo, serviços educacionais e serviços médicos, entre outras
áreas de serviços. Os participantes terão a oportunidade de explorar
possibilidades de cooperação empresarial e manter-se atualizados sobre os
últimos progressos no comércio de serviços.
Em suma, apesar
de um ambiente econômico interno e externo complexo, o comércio de
serviços da China tem mantido o crescimento. Os dados disponíveis mostram que o
valor total do comércio de serviços chinês aumentou 12,9% em termos anuais,
para quase seis trilhões de yuans (US$ 828 bilhões) em 2022, mantendo o segundo
lugar a nível mundial durante nove anos consecutivos. No primeiro semestre
deste ano, o setor continuou a crescer até atingir um valor total de 3,1
trilhões de yuans, marcando um aumento anual de 8,5%.
À medida que a
China aprofunda a abertura do seu setor de serviços, projeta-se que a escala do
comércio de serviços mantenha o crescimento ao longo do ano e que a sua
estrutura comercial continue a aprimorar-se. O fato é que o comércio de
serviços da China tem registrado uma melhoria na qualidade e na competitividade,
com os serviços intensivos em conhecimento tendo representado 43,5% do comércio
total de serviços no primeiro semestre de 2023. A realização da CIFTIS 2023
contribuirá para injetar um impulso adicional na economia global.
(*) Mestre em Economia e doutor em
Relações Internacionais pela UnB e rx-secretário de Assuntos Internacionais do
governo do Ceará. Pesquisador
independente das relações China-Brasil, China-Países Lusófonos e China-América
Latina.
Fonte: O Povo, de 10/9/23. Opinião. p.29.
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