O Ambulatório Geral de Pediatria do Hospital
Infantil Albert Sabin (HIAS), naquela manhã de segunda-feira, estava lotado de
pacientes, que, em parte, se acumulavam pelos corredores, em função da
coincidência de datas com a realização de um grande congresso nacional de
Pediatria em Fortaleza, motivando a liberação do trabalho, de dois dos
pediatras escalados para o atendimento.
Em vista disso, os três colegas, a postos no
serviço, desdobravam-se para dar conta dos pacientes agendados daquela manhã,
uma vez que muitas mães rechaçaram qualquer tentativa de remanejamento de
consultas para outra data próxima.
Dra. Fátima Gurgel (nome fictício), ciente e
antevendo o problema, chegara até um pouco mais cedo ao Ambulatório, para iniciar
os atendimentos. Por volta das 10h30, ela já estava na vigésima consulta,
quando a Joaninha (nome fictício), a atendente dos consultórios, veio alertá-la
de que Dona Gislena (nome fictício), a mãe da próxima criança a ser atendida,
estava muito revoltada e fizera um escarcéu na sala de espera, com ameaça de
denunciar o HIAS, no programa radiofônico do Paulo Oliveira.
Logo que a mãe e o menino ingressam no
consultório, a Dra. Fátima Gurgel dirige-se à mãe nos seguintes termos:
– Bom dia, D. Gislena! Está tudo bem com a
senhora e o seu filho?
– Bom dia,
coisa alguma, doutora – repeliu asperamente D. Gislena.
– Estou penando aqui
desde sete horas e perdi o meu dia de faxina. Quem é que vai pagar o meu
prejuízo? Um dia perdido de serviço, é dinheiro que vai fazer falta pras
compras lá de casa.
– Lamento, senhora. Mas minhas duas colegas
estão liberadas, nesta semana, para participar de um congresso. Essa é uma
atividade importante para que os médicos fiquem mais atualizados e possam
prestar um melhor atendimento aos nossos pacientes.
– Isso é lorota! Elas devem estar é zanzando
por aí, passeando ou fazendo compras nas boutiques das madames. Foi só o
dono daqui morrer, ganhar um paletó de madeira, que esse hospital degringolou e
essas médicas se aproveitaram da situação pra fazer corpo mole.
– E quem era o dono desse hospital, D.
Gislena? – A médica tinha em mente que esse hospital pediátrico de Fortaleza
era, equivocadamente, denominado de “Roberto Seis” por sua clientela pouco
atenta e de baixa instrução.
– Era esse tal de “Alberto Seibe”, o que
“bateu a cachuleta” na semana passada, o dono deste troço aqui – completou D.
Gislena.
Dra. Fátima Gurgel percebeu, então, que o
diálogo com a interlocutora materna não deveria prosperar e concentrou a sua
atenção nas necessidades mais visíveis e imediatas da criança.
Marcelo Gurgel Carlos
da Silva
Da Sobrames/CE e da Academia Cearense de Médicos Escritores
Fonte: SILVA, Marcelo Gurgel Carlos da. Medicina, meu humor! Contando causos médicos. 2.ed. Fortaleza:
Edição do Autor, 2022. 144p. p.19-21.
* Republicado In: SILVA, M.G.C. da. AMC. Causo médico: a morte do nome. Informativo AMC (Associação Médica
Cearense). Março de 2022 - Edição n.10, p.11-12 (em pdf).
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