Por Cláudio Ribeiro (*)
Ele é decano da
Igreja Católica no Brasil, o bispo mais idoso no País. Na sua inquietude, segue
tocando projetos. No dia do seu aniversário de 100 anos, em 3 de outubro de
2024, pretende lançar mais um livro. De poesias
Aos 99 anos de idade, dom Manuel Edmilson da Cruz é serelepe.
Não há pecado em chamar assim um sacerdote quase centenário. Ele se antecipa: “É
Manuel com U. E é 'Da Cruz', não esqueça o Da”. Não é um detalhe,
é o nome. Quando estendo a mão e lhe peço a bênção, me corrige com seu carisma
e pede que eu lhe abençoe antes. Fui surpreendido. Digo que não ousaria, ele
insiste: “Você que me abençoe”. Tomo o gesto como um
acolhimento, transparência. Beijo-lhe a mão respeitosamente.
A linha desta coluna se propõe a falar sempre de personagens
desconhecidos ou histórias anônimas, escondidas entre as nossas rotinas, nossas
cegueiras imperdoáveis sobre todas as importâncias. Mas aqui cabe dom Edmilson
e sua grandiosidade. Por toda a obra. Principalmente por estarmos atualizando
a linha de nosso tempo, novo ciclo. É alguém que nos faz refletir.
Bispo emérito de Limoeiro do Norte, dom Edmilson é o decano da
Igreja Católica no Brasil. É hoje o bispo mais idoso no País. Diz já ter sido
informado sobre isso, a partir dos registros da Conferência Nacional dos Bispos
do Brasil (CNBB). “Sou eu”, balança a cabeça confirmando, dentro da modéstia.
Em 5 de dezembro, completou 75 anos de sua ordenação
presbiteral. Suas lembranças ainda trançam alguns momentos daquele jovem que
saiu de casa cedo, do distrito de Aranaú, município de Acaraú, para ir estudar
no seminário em Sobral. De lá deu sequência à sua vocação. Ou missão: “Sempre
vou ser padre”.
Dom Edmilson é um atravessador de tempos. Dos sete arcebispos da
história da Arquidiocese de Fortaleza, foi contemporâneo de seis deles. Desde
dom Antônio de Almeida Lustosa (1941–1963), hoje alçado ao posto de
venerável — etapa que antecede uma possível beatificação ou canonização —,
até dom Gregório Paixão, recém-chegado. Compareceu à missa de posse do novo no
início deste mês, na Catedral Metropolitana. Por sua relevância, foi citado
três vezes no discurso.
Mesmo 25 anos depois de ter deixado a titularidade da diocese
(1994–1998), dom Edmilson não para. Nunca parou. É um inquieto sem perder a
ternura e a serenidade jamais.
A disposição impressiona. Diariamente, lê “todas as páginas” do
jornal — faz questão da edição impressa. Antes disso, já tem feito as
orações, pessoais e silenciosas. Preserva sua devoção. Os livros, procura ler “em
mais de um idioma, para não perder a prática e aprender”.
Latim, italiano, espanhol, inglês, “podia ler em grego, mas
perdi o hábito”. Está estudando alemão.
Às 18 horas, fora situação muito excepcional, celebra missas na
capelinha da casa da Congregação das Irmãs Josefinas, onde mora, no bairro de
Fátima. Uma delas diz sem confidência: “Ele não para mesmo”.
E agora tem mais um feito pronto para apresentar em 2024:
pretende publicar mais um livro. Só de poesias. São mais de 90 inéditas. É mais
uma das frentes do seu repertório de delicadezas e lucidez, duas das palavras
que ajudam a descrever seu perfil. Também lhe cabem o ousado, o forte, o justo,
o corajoso, o vocacionado, homem de fé. E generoso. Gosta de repetir: “Diga-me
o que sabes e te direi quem és”.
O livro se chamará “Ritmo Pascal”.
Ainda não sabe se usará todos os versos, se dividirá em mais de uma edição. Sem
lamuriar, busca os apoios financeiros e editoriais necessários. Tem uma
impressão “caseira” já feita, mas merece acabamento melhorado. São escritos que
vem lapidando de muito tempo. A ideia é lançar no dia do seu aniversário de 100
anos, 3 de outubro. A data merece celebração digna e condizente com a dimensão
de dom Edmilson.
O corpo franzino, envergado pela escoliose, e a voz baixinha,
não silente, são sua armadura — mas não para guerras, ele é contra qualquer uma
delas. Seu lema na Igreja é "verbum caro factum"
("palavra feito carne", em latim). Mesmo quando o físico já lhe é
mais frágil que o mental, segue com planos para a vida. Não há por que esperar,
ora! “Me sinto privilegiado”. Ao me despedir, voltei a
beijar sua mão. Em agradecimento.
(*) Jornalista de O
Povo.
Fonte: O Povo, de 30/12/2023. Cidades. p.21.
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